Sítio histórico-arqueológico inédito do chamado
"caminho do ouro" é descoberto na região do Paraíba do Sul.
Cláudio Prado de Mello
Historiador e arqueólogo, Diretor-Presidente do Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro
Historiador e arqueólogo, Diretor-Presidente do Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro
Foi
descoberto um trecho de quase 3 km do até agora desconhecido calçamento
original do Caminho do Ouro (ou a Estrada Real) que passa pelo Município de
Paraíba do Sul e segue até Minas Gerais. A descoberta se deve ao Pesquisador
Denis De Abreu Oliveira, que levou a notícia ao Secretario de Planejamento
Getúlio Junior e ocorreu em 2013. Paraíba do Sul é o município pioneiro da
Serra Fluminense, disseminadora de civilização na região e local extremamente
rico em termos históricos.
O
IPHARJ - Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro,
representado por Claudio Prado de Mello (que estuda o Caminho do Ouro desde
2007) procura agora auxiliar a Prefeitura de Paraíba do Sul a reconhecer e
valorizar seu rico e inestimável Patrimônio Cultural.
O
trecho descoberto estava coberto de vegetação e constitui local até agora
desconhecido pelos pesquisadores do Instituto Estrada Real. Este caminho ligava
o Rio de Janeiro às Minas Gerais e foi aberto há mais de 300 anos pela Coroa
Portuguesa. Nas partes já conhecidas e revitalizadas (principalmente em Paraty)
, a Estrada Real tornou-se um destino turístico reconhecido no Brasil e no
exterior. A estrada passa por 199 municípios – 169 em Minas Gerais, 22 em São
Paulo e nove no Rio de Janeiro – e tem 1,6 mil quilômetros de extensão.
A
Estrada Real ou o Caminho do Ouro era o nome alusivo a qualquer via terrestre
que, à época do Brasil Colônia, era percorrida no processo de povoamento e
exploração econômica de seus recursos. Entre os séculos XVII e XIX um conjunto
de vias terrestres – muitas delas simples reapropriações de antigas trilhas
indígenas (peabirus) – aproximou diferentes regiões do território brasileiro.
Os peabiru (na língua tupi, "pe" – caminho; "abiru" -
gramado amassado) são antigos caminhos, utilizados pelos indígenas
sul-americanos desde muito antes do descobrimento pelos europeus, ligando o
litoral ao interior do continente.
Em
1681 Garcia Rodrigues Paes, filho do Bandeirante, Fernão Dias, descobriu um
remanso no Rio Paraíba do Sul. Sabendo que o local era próximo ao Rio de
Janeiro, viu a possibilidade de ali abrir um novo caminho que aproximasse o
tráfego entre as minas de pedras preciosas (descobertas pelo seu pai) ao porto
do Rio de Janeiro. Segundo documentação, em 1682 Garcia firma um contrato
prometendo abrir “o mais direto caminho que pode haver entre as minas e o mar”.
Recebendo em troca pelos serviços prestados, terras e privilégios, desde que
descobertas ouro e pedras preciosas. No ano de 1683, surge a ocupação inicial
com a Fazenda de Garcia que deu origem a cidade. Após 15 anos, com a descoberta
e exploração do ouro em Minas Gerais, iniciou a abertura do "Caminho
Novo".
A
Fazenda da Parahyba se tornou local de abastecimento com milho, peixe e caça
para as frentes de trabalho de índios purís, escravizados pelos agregados de
Garcia - os curibocas guaianás do Planalto de São Paulo. O trecho do caminho
entre Paraíba e Rio de Janeiro foi concluído em 1700, e em 1704 atingiu a
Mantiqueira, onde o "Caminho Novo" uniu-se ao já existente que vinha
de São Paulo. O guarda mor das Minas, Garcia Rodrigues Paes, recebe sesmarias
de quase 40 Km x 13 Km ao longo do caminho.
De
1698 a 1700 abriu o trecho do Paraíba ao Rio de Janeiro, e até 1704 o que
atingiu a Serra da Mantiqueira. Aí, na região da atual Barbacena, o Caminho
Novo se juntou ao Velho, que vinha de São Paulo. De 1709 a 1711 esteve Garcia
em Lisboa, lutando para que Dom João V cumprisse as promessas do pai pela
abertura do Caminho Novo. Foi nesse interregno que Maria Pinheiro da Fonseca, a
esposa, guardou na fazenda o tesouro colonial trazido às pressas do Rio de
Janeiro invadido pelos franceses. Vindo a falecer em Paraíba do Sul no ano de
1738, o desbravador Garcia Paes deixa uma das maiores fortunas do Brasil
Colonial a seus descendentes - os Paes Lemes - que mantiveram as terras da
Fazenda da Parahyba vivendo de arrendamentos e recebendo "foros" até
1833, quando então é elevada a Villa da Parahyba do Sul.
Paraíba
do Sul está intimamente ligada a história da Inconfidência. Possui na Vila de
Sebolas, 3º distrito, os restos mortais de Tiradentes; que por determinação da
sentença de morte, foram expostas em frente à Fazenda das Sebollas, local onde
o inconfidente pregava a Independência do Brasil.
O
novo trecho descoberto é formado por placas de pedras arrumadas de uma forma
que chamamos de pé-de-moleque . Alem do piso original do calçamento, vê-se ao
longo do terreno muros de arrimos que ajudavam a conter partes mais altas das
estradas, e em alguns casos vestígios arqueológicos espalhados pelo solo.
Sabe-se que ao longo dos caminhos existiam casas e estalagens e existe grande
expectativa da Arqueologia poder resgatar mais e mais do passado dessa região.
Devido ao fato do local ser de difícil acesso e sem interesse econômico foi
esquecido e dessa forma preserva as formas e atmosfera do passado de 332 anos
quase que intacto.
Detalhes
do calçamento do trecho descoberto e de muros de arrimo nas laterais da estrada
O
percurso do Caminho Novo começava em embarcações à vela, no centro histórico da
cidade do Rio de Janeiro, no antigo Cais dos Mineiros, entre o sopé do morro de
São Bento e a atual praça XV de Novembro, quase em frente a atual igreja da
Candelária. Depois de uma escala na Ilha do Governador, seguia-se navegando até
ao fundo da baía de Guanabara e adentrava-se pelo rio Iguaçu e, depois pelo seu
afluente, o rio Pilar, percorrendo-se um total de doze quilômetros em rios.
Desembarcava-se no porto de Pilar do Iguaçu, atualmente um bairro do município
de Duque de Caxias, onde ainda existe a igreja da época. Parte desse caminho
foi calçado por Conrado Jacob Niemeyer, cujo calçamento persiste em excelente
estado de conservação no interior da Reserva Biológica do Tinguá (nos
municípios atuais de Nova Iguaçu e Miguel Pereira). A partir daí iniciava-se a
pé, a cavalo ou em mulas, a viagem por uma estrada que seguia até a vila de
Xerém, passava pela atual Reserva Biológica do Tinguá, pela extinta freguesia,
arraial e igreja de Santana das Palmeiras, subia a serra até Paty do Alferes .
Como Garcia Rodrigues Paes abriu o caminho do interior para o litoral, não
cuidou ou não pode escolher o trajeto menos ingreme. A subida da serra de Xerém
até Paty do Alferes era de difícil acesso, fazendo com que cargas fossem
perdidas, mulas caíssem em despenhadeiros e homens se ferissem. Além disto era
comum os ataques indígenas e de bandidos. Dali, descia em direção a Paraíba do
Sul onde cruzava o rio do mesmo nome. Daí seguia até Ouro Branco. Esse foi o
caminho utilizado para escoamento do café do Vale do Paraíba, por tropas.
Em
1704, Garcia Rodrigues Paes, com saúde e fortuna arrasados por anos de trabalho
extenuante, passou a tarefa de conclusão da nova rota para seu cunhado Domingos
Rodrigues da Fonseca. Somente em 1709 o Caminho Novo passou a ser utilizado regularmente
por tropeiros, encurtando o tempo de viagem de 100 para 25 dias. Nesta época, o
Caminho do Ouro de Paraty passou a ser conhecido como "Caminho
Velho".
Até
o início do século XIX, a região era percorrida por várias tribos de índios
nômades conhecidas genericamente como coroados. O caminho descia a serra pelos
atuais distritos de Avelar e Werneck até cruzar o rio Paraíba do Sul, onde hoje
está a cidade de Paraíba do Sul. Depois seguia-se, sentido norte, atravessando
a Serra das Abóboras, alcançando Paraibuna, em território do atual município
fluminense de Comendador Levy Gasparian e, daí, internando-se em território
mineiro, seguia até a atual Juiz de Fora até atingir a região de Vila Rica
(atual Ouro Preto).
Foi
realizada na data de 27 de Outubro último a Expedição Exploratória do Caminho
do Ouro dentro do Município de Paraíba do Sul, na fronteira do Estado do Rio
com Minas Gerais. A equipe foi formada por 12 pessoas, liderada pelo
Pesquisador Denis De Abreu Oliveira e o Secretario de Projetos de Paraíba do
Sul, o Arquiteto Getulio Junior. A equipe incluiu a Secretária Municipal de
Cultura, Veronica Rocha, o Representante do INEPAC, Rafael Azevedo e o Arqueólogos
do IPHARJ (que está com projetos em andamento dentro do Município). Na ocasião
foram encontrados vestígios arqueológicos e o Registro do Sitio já foi
encaminhado para o Cadastro Nacional de Sitios Arqueológicos do IPHAN.
O
Caminho do Ouro de Paraíba do Sul é surpreendente, pois a cada passo
vislumbramos muitas florestas intocadas, maciços rochosos aparentemente
intransponíveis, mas que Fernão Dias Paes penetrou como grande bandeirante
brasileiro, e logo depois seu filho Garcia Rodrigues Paes Leme. Na data de hoje
se comemora 332 anos de muita história, de um dos municípios mais antigos do
Brasil.
Para
celebrar esta grande descoberta a Prefeitura de Paraíba do Sul, na
administração Marcinho de Abreu recebeu a ideia do IPHARJ e da Secretaria de
Planejamento e instituiu a criação do MARCO – Museu Arqueológico do Caminho do
Ouro, já foi aprovada pela Prefeitura e esta se mobilizando para transformar
esse projeto em realidade
Equipe da Expedição em frente ao prédio do Registro de
Paraibuna - RJ
Fonte: Café com História
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