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Este Blog, do Projeto Prex-Unitau Taubaté Tempo e Memória, tem como objetivo ser um canal de troca de informações sobre a História e a Memória da Região Metropolitana do Vale do Paraíba (RMVale).

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

ARTIGO



Série Raízes do Brasil
PARTE 3

Avenida Central (hoje Rio Branco) em 1910
Foto Marc Ferrez  



Os Bestializados e a República que não foi
 



Por que cidadãos inativos?


            A história do Brasil mostra-nos que uma parcela reduzida dos brasileiros desfrutou dos direitos de cidadania, nos quase quatro séculos de Brasil Colônia e Império, em que isso foi considerado normal.
            Os republicanos não alteraram a ordem das coisas, pois foram preservados os interesses das oligarquias agrárias que detinham o poder de decidir os destinos do país.
            Ser cidadão era uma condição reservada a poucos. Nem militares, nem liberais instituíram um sistema de poder voltado para a transformação dessa grande maioria da população pobre em cidadãos plenos.
            A República manteve quase todas as exclusões em relação ao voto. Nas primeiras eleições diretas para presidente, em 1894, votaram apenas 7.857 pessoas, ou seja, 7% do eleitorado potencial, 1,3 da população. A grande maioria estava excluída do processo eleitoral.
            Outra questão que José Murilo de Carvalho levanta trata da concepção de alguns intelectuais, principalmente dos estrangeiros, em relação ao povo.
Eles desejavam observar, aqui no Brasil, os mesmos acontecimentos que ocorriam na Europa. Mostraram-se extremamente preconceituosos, quando colocaram os nativos e negros à margem dos acontecimentos.
            A crença numa total inexistência de um povo participante e politizado é exagerada, pois a população da cidade do Rio de Janeiro participou de alguns acontecimentos políticos desde a Independência. Prova disso é a Revolta do Vintém (1880) e os comícios e manifestações a favor da abolição, que contou com um envolvimento popular.
Segundo esses intelectuais estrangeiros e republicanos, seria necessário buscar cidadãos na Europa, recorrendo-se à imigração. São Paulo recebia 100 mil imigrantes por ano, cerca de 40% de todos os estrangeiros que chegavam ao país.
Outro fato que o autor questiona é quanto à apatia política dos fluminenses e dos brasileiros de um modo geral, na qual esses intelectuais acreditavam. Alguns republicanos pensavam que os militares poderiam instituir qualquer governo, que o povo o aceitaria com submissão total, como foi na implantação da República, em 15 de novembro de 1889.
A resposta à pouca participação do povo na Nova República deve ser buscada na visão elitista dos liberais e dos positivistas. Os políticos tradicionais não mudam a função do Estado, mesmo com a mudança na forma de governo do Império para a República.
Em São Paulo, o partido republicano cresceu sobretudo por causa de sua defesa do federalismo; embora prometesse progresso para todos, mantinha os privilégios para a oligarquia cafeeira paulista.
Os observadores contemporâneos, brasileiros e estrangeiros, traziam no bojo o preconceito em relação ao país e ao seu povo.
Podemos verificar que, tanto os militares, como os republicanos paulistas não previam uma grande participação popular no governo. Para ambos, caberia, apenas aos mais competentes e que tinham os ideais de Ordem e Progresso, o direito de participar e de definir as decisões políticas. Portanto, a política era assunto apenas das classes dominantes.
Concluímos que, tanto os observadores estrangeiros, quanto os intelectuais republicanos estavam sem dúvida buscando o cidadão ao estilo europeu. Ou, então, o povo nem sempre seguia o que eles esperavam ou que julgavam correto. Para Raul Pompéia, o bom era o brasileiro republicano, nacionalista, florianista; o mau era o monarquista, antinacionalista e o politicamente apático.
            A concepção de cidadão, na história do Brasil, está mais relacionada ao seu bom comportamento do que realmente às manifestações realizadas por eles. Podemos verificar que a maioria dos meios de comunicação de massa tratam os participantes de movimentos organizados -sindicais e populares - como baderneiros, desvalorizando-os, pois geralmente mostram só as questões negativas relativas a eles, deturpando as suas conquistas.
 

ARTIGO



Série Raízes do Brasil
PARTE 2

 
Prof. Dr. José Murilo de Carvalho 
Foto divulgação - Companhia das Letras



Os Bestializados e a República que não foi
 

Os funcionários públicos e a República


Outro grupo que merece referência é o dos funcionários públicos, operários dos arsenais do Exército, da Marinha, das ferroviárias, dos gráficos, da casa da moeda, portuários. Eles viam na República uma oportunidade de redefinir seu papel político.

Em 1890, criaram o Partido Operário, abrigando também operários do setor privado. Havia disputas entre líderes operários, como França e Silva, que lutava por um partido controlado pelos próprios operários, e o tenente José Augusto “Vinhaes”, que esteve envolvido em diversas greves políticas, como as dos ferroviários, em 1891, e as dos estivadores, carroceiros e ferroviários, em 1900. Ele elegeu-se para constituinte com apoio dos operários, forçou o governo a mudar o Código Penal sobre as greves e a coligação operária, lutou pelo aumento dos salários e defendeu a ampliação de votos ao povo em geral, servindo de intermediário entre os operários e o governo.



A influência do Positivismo

Outro aspecto que o autor ressalta é a influência do Positivismo em quase todas as lideranças republicanas. A noção positivista de cidadania não incluía os direitos políticos, não aceitava os partidos e a democracia representativa. Os direitos não podiam ser conquistados, o povo deveria ficar à espera da ação iluminada do Estado.

Houve várias tentativas de formar partidos socialistas operários no Rio e em São Paulo, nas duas primeiras décadas republicanas. As propostas eram: maior participação e reformas sociais.

A rigidez e a resistência em ampliar a cidadania do sistema republicano só deixavam ao operário a opção entre o socialismo reformador – os que defendiam cooperação com o governo – e o anarquismo revolucionário – os que rejeitavam totalmente o sistema político.

Os anarquistas, numa visão coletivista, eram pela revolução social, pela abolição da propriedade privada e do Estado, mas admitiam o sindicalismo como instrumento de luta. Os anarquistas individualistas, por sua vez, pregavam a abolição do Estado, porém eram contra toda forma de organização que não fosse espontânea, além de desejarem a manutenção da propriedade privada após a revolução.

Tanto estes como aqueles repudiavam o Estado e tinham aversão à luta política por meio de partidos e eleições.