universidade de Taubaté
Glauco
Antônio dos Santos Rodrigues
Jonathan
Augusto da Costa
a capela de nossa senhora do pilar: devoção e sociedade na taubaté
colonial
taubaté – sp
2011
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Glauco Antônio dos Santos Rodrigues
Jonathan Augusto
da Costa
a capela de nossa senhora do pilar: devoção e sociedade na taubaté
colonial
Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação apresentado ao
Departamento de Ciências Sociais e Letras da Universidade de Taubaté, como
parte dos requisitos para colação de grau no curso de História (Licenciatura).
Orientador: Prof. Ms. Armindo Boll
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U N I T A U
Departamento
de Ciências Sociais e Letras
taubaté – sp
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autores:
Glauco
Antônio dos Santos Rodrigues
Jonathan
Augusto da Costa
TÍTULO:
A
Capela de Nossa Senhora do Pilar: Devoção e Sociedade na Taubaté Colonial
Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação apresentado ao
Departamento de Ciências Sociais e Letras da Universidade de Taubaté, como
parte dos requisitos para colação de grau no curso de História (Licenciatura).
Orientador: Prof. Ms. Armindo Boll
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Dedico esse trabalho aos
meus pais, à minha amada esposa, meu amado filho, que fazem toda a jornada
valer a pena. E aos grandes amigos da faculdade, que trilaram esse caminho
comigo.
Glauco Rodrigues
|
Dedico essa pesquisa a
Deus, e a Virgem do Pilar, aos meus amados pais, e à memória da minha
saudosa avó, além dos inúmeros amigos da faculdade e fora dela, que
conosco participaram dessa conquista em prol da memoria da cidade de
Taubaté.
Jonathan Costa
|
agradecimentos
Aos meus pais, Carlos e Isis, que são minha total
fonte de inspiração, meu modelo e exemplo de vida.
A minha esposa, Alexandra, pelo imenso carinho,
companheirismo, dedicação e compreensão, que faz um projeto de uma vida, ser
vivido a dois, de maneira plena e inesquecível.
Ao meu filho, Vitor, que em seus nove anos de vida,
inúmeras vezes me ensinou mais do que eu a ele.
Aos professores do curso de História.
Aos profissionais de grande admiração e apoio ao nosso
estudo, Antonio Carlos Argôllo, Olga, Benê, Luiz Antonio Cardoso.
Ao meu compadre, amigo e irmão tantas lutas e
conquistas, Jonathan Costa.
Aos meus amigos de faculdade, Glauco Santos, Luciana,
Giovanna, Sheyla, Alessandra, Vanessa, Virgínia, Glaucia, Matheus, Caíque,
Renan, Bruna, Felipe, Tiago, Adriano e demais, que tanto contribuíram para
estarmos aqui. Tenho orgulho de ter estudado com todos vocês.
E, aos grandes, Tom e Thereza Maia, que além de ícones
em nossa área, hoje podemos chamá-los de amigos.
Glauco Rodrigues
.
Aos meus amados e valorosos pais, Joana e Benedito,
inspiração e sustento na razão do meu viver, bem como toda minha família.
À memória saudosa de Floripes, minha avó, mulher cuja
História de vida, complementou meu esforço e razão de ser um Historiador.
Ao querido amigo, irmão e compadre, Glauco Rodrigues,
companheiro de lutas e conquistas, bem como a querida comadre Alexandra, pelo
apoio inestimável para que todo o esforço se tonasse concreto.
Aos amigos valorosos que a vida me presenteou, como
Thaíse, Galvão, Stella, Vinicius, Geisa, Jéfit, Lilian, Claudia Serra, Jéferson
e Bruno, e a tantos outros que fazem parte da minha História de vida.
Aos amigos do curso de História, verdadeiros irmãos em
todos os momentos, onde encontramos verdadeiros exemplos de profissionais e de
seres humanos, como: Glauco Santos, Alessandra, Giovanna, Sheyla, Matheus,
Vanessa, Bruna, Luciana, Renan, Tiago, Adriano e todos os demais que conosco
deram animo para que tudo fosse possível.
Professores do curso de História, cuja sabedoria nos
inspirou no caminho profissional.
E por fim aos valorosos profissionais, que nos
auxiliaram nessa pesquisa em prol de Taubaté, como Professor Argôlo, Professora
Olga, Professor Benê e Luiz Antonio, que nos deram conhecimento e animo para que
o trabalho realiza-se, bem como aos profissionais, cuja trajetória de vida são
exemplos que nos inspiram, e que ousamos chamar de amigos, Tom e Thereza Maia.
Jonathan Costa
“Importantíssima não só para
a História de Taubaté, mas para o Brasil... a Capela do Pilar.”
Tom e Thereza Maia
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Prefácio
Muito oportuno o tema escolhido pela dupla:
Glauco Rodrigues e Jonathan Costa para seu trabalho de conclusão de curso.
Formandos em História demonstram estar seriamente preocupados com o destino da
Capela do Pilar, como importante exemplar do patrimônio histórico, não apenas
de Taubaté, mas reconhecidamente, de todo o Vale do Paraíba. E essa preocupação
representa uma aplicação prática de tudo aquilo que certamente aprenderam em
teoria, durante a realização do curso que estão completando.
Tendo a oportunidade de atuar como coordenador
do extinto Museu de Arte Sacra da Prefeitura Municipal, no período de 1998 a
2000, poucos anos depois de haver publicado “Capela de N. Sra. Do Pilar de
Taubaté, Um Exemplar do Barroco Mineiro no Vale do Paraíba Paulista” – lançado
em 1991 pela Coleção Tropeirista da Fundação Nacional do Tropeirismo,
disponível para consulta na biblioteca d Divisão de Museus, Patrimônio e Arquivo
Histórico de Taubaté, muito me agrada e surpreende perceber que dois jovens
estudantes possam ter se interessado por esse tema e solicitado minha opinião
sobre o seu trabalho.
A escolha que fizeram, ao apresentar a História
da Capela, não poderia ter sido melhor. Trata-se de um dos poucos exemplares
arquitetônicos de importância histórica ainda presente em nossa paisagem
urbana, até quando, infelizmente, não podemos precisar. Bom seria, se este
trabalho pudesse ser publicado e amplamente divulgado, para que despertasse a
consciência de nossas autoridades, mobilizando-as pela sua recuperação,
enquanto ainda é tempo de agir. Faço votos que isso aconteça pelo bem de nossa
cidade e em nome das futuras gerações, pois certamente repercutiria muito mal,
em todos os aspectos, se Taubaté e os taubateanos deixassem perder tal
patrimônio.
Resumo
Testemunha
ocular da História de Taubaté, e do Brasil, a capela erguida pelas mãos de seu
idealizador Timóteo Corrêa de Toledo, entre 1747 e 1760, cidadão abastado, e
proeminente na sociedade local, trouxe para o templo um contexto histórico de
destaque, nos âmbitos social e religioso, que não se resumiu apenas a uma
condição de capela particular, abrangendo um referencial de propriedade
espiritual, e temporal, cujos reflexos são nítidos ainda hoje na ambiguidade
entre o público e o privado, entre o sagrado e o profano.
Todavia, hoje,
esse patrimônio encontra-se no quadro de esquecimento através do imaginário
coletivo, que, desvaloriza o papel da capela no cenário da história regional e
nacional, onde sua relevância se torna pertinente para novas análises e
leituras historiográficas, para que possamos reinserir essa testemunha “viva”
da história na sociedade, tendo a preocupação de promover reflexões que destoam
das simples análise de um bem histórico que existe, mas que não encontra
espaços concisos e efetivos na sociedade do século XXI, que já não é mais a
mesma da Taubaté de Timóteo Corrêa de Toledo, quando o mesmo idealizou e
projetou esse bem “sobrevivente” da história de Taubaté.
Palavras-chave: Taubaté, Pilar, devoção
Abstract
Eyewitness History of Taubate, and
Brazil, the chapel built by the hands of its creator Timóteo Corrêa de Toledo,
between 1747 and 1760, wealthy citizen, and prominent in local society, brought
to the temple featured a historical context, in the areas social and religious,
not merely a condition of the private chapel, including a reference property
spiritual and temporal, whose reflexes are still sharp on the ambiguity between
public and private, between the sacred and the profane.
However, today, that heritage is
under oblivion through the collective imagination, which devalues the role of
the chapel in the setting of regional and national history, where its relevance
becomes relevant for further analysis and historiographical readings, so we can
re-enter this witness "live" history in society, and the concern to
promote reflections that diverge from the simple analysis of a historical site
that exists, but that has no spaces concise and effective in the twenty-first
century society, which is no longer the same as Taubaté’s Timóteo Corrêa de
Toledo, even when well conceived and designed this "survivor" history
of Taubaté.
Keywords: Taubaté Pillar, devotion
Lista de Figuras
Sumário
INTRODUÇÃO....................................................................................1
1 A CAPELA DO PILAR NA TAUBATÉ
COLONIAL..................4
1.1 A Vila de São Francisco das Chagas de Taubaté:
aspectos
da vida colonial.................................................................4
1.2 Igreja e sociedade:
o papel
das irmandades na Taubaté colonial...................................9
1.3 A devoção a Virgem Del’ Pillar ....................................................17
1.4 O Barroco Mineiro na Vila de Taubaté:
Arquitetura
e Construção...............................................................20
2 O CONSTRUTOR..........................................................................30
2.1 Acertos para a edificação da capela...............................................30
2.2 Timóteo Corrêa: “Homem bom” da Vila de
Taubaté....................33
2.3 Os Toledo Piza: do sagrado ao profano.........................................37
3 A CAPELA DO PILAR E SUAS PROJEÇÕES..........................43
3.1 O Pilar de Taubaté: memória e
sociedade .....................................43
3.2 O Pilar de Taubaté: patrimônio e
cultura......................................48
3.3 O Pilar de Taubaté: imaginário
esquecido....................................53
CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................60
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................62
ANEXOS............................................................................................6
5
|
Introdução
Com essa
pesquisa pretendemos descrever um pouco sobre a origem da devoção a Nossa
Senhora do Pilar e a edificação de sua Capela em Taubaté no período colonial.
Também buscamos analisar como, ao longo dos séculos a capela foi considerada um
bem patrimonial da cidade.
Devoção e
sociedade, sagrado e profano, patrimônio e memória, através dessa dialética a
Capela de Nossa Senhora do Pilar, construída entre 1747 e 1760, representa um
exemplar vivo da arquitetura religiosa barroca do século XVIII.
Para nós, a
escolha em pesquisar um tema ligado à história
regional, origina-se, primeiramente, na análise acerca da própria identidade de
cidadãos taubateanos que somos, e, que queremos, dessa forma, conhecer mais
sobre nossas origens, sem ufanismos ou demagogias, pois é inerente ao
pensamento humano, o questionamento de onde viemos, o que representamos hoje, e
as prospecções de nosso futuro.
Nesse panorama, recordamos das aulas de
História Regional, em que tivemos a possibilidade de adentrar no conhecimento acerca
de nossa região e seu patrimônio histórico as quais nos possibilitaram
questionar o cuidado que temos com nosso patrimônio. Neste contexto nasceu-nos
o desejo de pesquisar sobre um bem tombado de nossa cidade – a Capela de Nossa
Senhora do Pilar, questionando-nos sobre a
preocupação com sua efetiva preservação.
Também será
objetivo de nosso estudo como e porquê foi contruída
esta capela, que foi erguida pelas mãos de Timóteo Corrêa de Toledo.
Tradicionalmente
as capelas no Brasil colonial surgiam a partir da organização de uma Irmandade
que, na maioria das vezes, iniciava suas atividades na Igreja Matriz de uma
determinada localidade. Todo esse processo, na maioria dos casos, resultava na
construção de um templo de dimensões razoáveis, porém, com muito esforço da
comunidade. De maneira especial, com a Capela do Pilar a situação acontece de
outra maneira, o próprio fundador da capela tomou as iniciativas de sua obra,
sem que houvesse uma participação maciça da sociedade taubateana, ou de uma
elite, bem como de alguma confraria local. Essas características acentuam de
maneira clara, as reflexões de como era necessário para o imaginário do período
colonial a participação dos membros abastados da sociedade, os chamados “homens
bons”, como o historiador Caio César Boschi vai dizer em uma de suas obras,
sobre o período, que para mostrar um aparente fervor religioso, o indivíduo não
media recursos. A vaidade e o exibicionismo de sua generosidade faziam dele um
contribuinte permanente das receitas financeiras das irmandades. No caso de
Taubaté, temos esse papel representado por Timóteo Corrêa de Toledo, bem como
de sua família.
Na dualidade de
sentimentos acerca da visibilidade social que a capela exercia no imaginário
popular, temos a devoção à Nossa Senhora do Pilar, originária dos primórdios do
cristianismo ocidental, mais precisamente, no ano 40 da era cristã, em
Saragoça, em terras espanholas. A fé à Virgem Del´ Pillar conquista seus
devotos no Novo Mundo de maneira especial na colonização brasileira, inserida
em diversos lugares, como na vila de Taubaté, pelos descendentes de origem
espanhola que aqui se instalaram.
Possibilitou
que as vivências humanas em torno dessa edificação no decorrer do processo
histórico, fossem se modificando, juntamente com a própria sociedade, à medida
que, houve uma série de inversões de valores no imaginário coletivo, onde a
Capela do Pilar acabou por deixar de ser vistas apenas como um bem religioso,
passando a ser analisada como um bem patrimonial.
No primeiro
capítulo dessa pesquisa, destacaremos o desenvolvimento social da vila de
Taubaté, bem como a inserção da Capela do Pilar nesse contexto, em um período
onde se acentuava o papel da Igreja na sociedade, através das irmandades e
confrarias religiosas. Além disso, também traremos reflexões acerca de devoção
à Virgem do Pilar, bem como dos principais aspectos da arquitetura e construção
em estilo barroco da referida capela.
No segundo
capítulo, abordaremos o processo de edificação da Capela do Pilar, acentuando o
papel de Timóteo Corrêa de Toledo, bem como de sua família para Taubaté,
fazendo também, uma reflexão sobre a dualidade entre sagrado e profano que essa
família exerceu sobre o imaginário do período em Taubaté.
No terceiro
capítulo, faremos um panorama da Capela do Pilar ao longo do processo histórico
taubateano, questionando a efetiva preocupação dos poderes – inclusive o
religioso, bem como da sociedade civil com sua preservação – tanto do seu
edifício histórico como do seu significado para a história de Taubaté, na
reabilitação do imaginário coletivo representado pelo simbolismo desta capela.
Para tanto, nos
servimos de depoimentos de pessoas como Tom e Thereza Maia, Antonio Carlos de
Argôllo Andrade, (nome completo da Olga) Olga da
Cúria Diocesana, ligadas de uma maneira ou de outra, à esta capela, além de
referências bibliográficas, inclusive jornais da época, tais como: Correio
Paulistano, Diário de Taubaté, O Lábaro e o Jornal de Taubaté.
1.
A Capela do Pilar na Taubaté Colonial
1.1
A Vila de São Francisco das Chagas de
Taubaté: aspectos da vida colonial
Com o advento da exploração e da ocupação
ocorrida na região central do planalto paulista, em meados do século XVI e
XVII, Jacques Félix, funda o povoado de São Francisco das Chagas de Taubaté, em
uma área concedida pela Condessa de Vimieiro, donatária da Capitania de
Itanhaém, da qual fazia parte a região do Vale do Paraíba, que por ordem da
mesma, intensificou-se a ocupação e as primeiras concessões oficiais de terras
dos sertões do Paraíba, cujas mesmas, datam de 1628. O governador Francisco da
Rocha concede à Jacques Félix, em 20 de janeiro de 1636, a autorização de
penetrar e demarcar o sertão de Taubaté, cujos limites eram desconhecidos.
No planalto existiam no Vale do Paraíba,
Jacareí, Taubaté, Guaratinguetá e no do Tietê, Mogi das Cruzes, Parnaíba, Itú,
Sorocaba, Jundiaí, no do Iguaçu, Curitiba. São Francisco das Chagas de Taubaté,
fundada em 1636 por Jacques Félix que se supõe santista, e vila em 1645,
tonar-se-ia núcleo bandeirante da maior importância. Sua atuação veio a ser
sobremaneira notável com a abertura do ciclo do ouro. Seriam os taubateanos os
pioneiros de tal fase. (TAUNAY, 1975, p. 189)
Com a elevação do povoado a categoria de
vila, em 05 de dezembro de 1645, mantendo a denominação de São Francisco das
Chagas de Taubaté, estabeleceu-se assim os oficiais da Câmara, que doravante
começaram a prestar serviços à vila, em 01 de janeiro de 1646, onde dessa
maneira, também se estabeleciam as diretrizes urbanas do governo português em
suas possessões, onde se enquadra a Vila de Taubaté.
A vila estava traçada num local alto e
plano onde hoje se encontra o centro da cidade. Dispondo simetricamente os
quarteirões em partes aproximadamente iguais, enumeradas e abertas suas ruas,
eregida a pequena igreja, mais a cadeia e a câmara, a nova Taubaté estava em
condições de levantar pelourinho em 1645. (MARTINS, 1973, p.41)
A Carta Régia que determinava a criação e
instalação da vila, tinha recomendações expressas do Conselho Ultramarino de
Lisboa, cujos padrões estruturais estabelecidos, deveriam obedecer normas
rígidas, quanto a presença de grandes construções para a legitimação do poder
nestes territórios. Deveria ser construída a grande Praça Central, onde seria
erguida a Igreja Matriz, simbolizando o poder religioso; a Casa da Câmara e Cadeia,
que simbolizava o poder civil, bem como o Pelourinho, que legitimava com sua
construção a vila, além de ser utilizado para o castigo dos criminosos e dos
escravos; o moinho de trigo e o engenho de açúcar, afim de, permitir as
capacidades econômicas para a subsistência da Vila. Nesse contexto estava se
acentuava a preocupação com o delineamento urbanístico do local onde a Vila
tomava seus aspectos, dentre eles se destacavam a largura das ruas, a extensão
das praças, a localização dos edifícios públicos, bem como os tipos de casas
residenciais que externamente tinham traçados iguais, sob a influência
portuguesa.
Esse traçado urbanístico, se é que podemos
chamar assim, elaborado por Jacques Félix, o moço, demonstra que a povoação foi
fundada depois de totalmente estruturada por um plano diretor, previamente
elaborado e não formada naturalmente como quase todas as vilas brasileiras.
Teria desenvolvimento natural se o moço e as medidas de exploração dessa área
pela donatária Vimieiro não tivessem existido e se o lugarejo, aqui existente
pré-fundação, viesse a prosperar. (MARTINS, 1973, p. 41)
Dentro desse contexto se destacava em meio
a paisagem urbana da Vila os templos religiosos, que expressavam o poderio da
Igreja católica na formação cultural dos indivíduos, que desde os primórdios da
colonização exerceu o papel de dominação dos indígenas, impondo-lhes a devoção
religiosa e a cultura na formação da mão de obra para as fazendas de criação de
gado. Nesse panorama se acentuou, posteriormente, a predominância do papel das
irmandades religiosas que exerciam as diretrizes organizacionais das vilas e
cidades, pois difundiam a fé cristã, exerciam as obras filantrópicas, construíam
os templos religiosos, bem como os cemitérios e, principalmente, tinham a
responsabilidade de representar a Coroa e legitimar o seu poder em meio a
sociedade colonial.
A Vila de
Taubaté nos séculos XVII e XVIII, afastada das duas capitanias que as rodeavam,
e longe das regiões auríferas das terras das Gerais, constituiu-se, entretanto,
uma espécie de sociedade local sem grandes requintes e riquezas, mas com farta
produção econômica vinda, de suas diversas fazendas de produção agrícola.
Essa comunidade semi-isolada, onde, se não
houve fausto também não grassou a miséria; com um catolicismo marcante,
orientado principalmente pela modéstia dos frades franciscanos; capaz de
iniciativas notáveis como o bandeirismo, a ocupação de vastas áreas geográficas
e a consolidação de uma agricultura tropical; mal recompensada, quase sempre,
pelos prepostos dos donatários e os governos da Coroa. (ORTIZ, 1996, p. 60)
A população da Vila desenvolvia uma
alimentação variada apoiada em uma racional policultura da época, mesmo nas
habitações mais pobres e senzalas locais. As casas dos grandes proprietários
urbanos e rurais eram altas e arejadas, com grandes cozinhas e vários quartos,
embora com mobiliário modesto.
[...]Ora era o pai que se ausentava do
serviço da Coroa ou em virtude de suas atividades, ora era a filha que se
casava fora do local de seu domicílio, ou o filho que partia numa expedição ao
sertão. Isso sem contar esposas e maridos que abandonavam a família para viver
com outros companheiros, além de, é claro, das repetidas interrupções dos laços
familiares causadas por mortes prematuras. É o espaço do domicílio que reúne,
apenas pessoas de uma mesma família nuclear e um ou dois escravos; em outros,
somavam-se a essa composição agregados e parentes próximos, como viúvas ou
irmãs[...] (NOVAIS, 1997, p. 86)
Essa sociedade, não diferentemente do
restante das demais partes da colônia, tinha como caráter um sistema totalmente
patriarcal, onde os pais escolhiam o casamento para seus filhos, e estes,
conheciam seus pares no dia da cerimônia de casamento, mediante ao acordo feito
entre as famílias, muito comum na Vila de Taubaté.
As mulheres casavam-se cedo, em geral entre
treze e dezesseis anos. Comumente engravidavam muitas e seguidas vezes e não
raro morriam de parto. Assim, um considerável número de homens da época não
levava à velhice a primeira esposa, casando-se duas, três ou mais vezes. Dessa
forma a idade dos noivos variava e as meninas podiam casar com rapazes da
quadra dos vinte anos ou com homens maduros ou até velhos.[...] Os homens
levavam vida mais livre e desde a adolescência ou mesmo depois de casados
buscavam relações sexuais com moças escravas ou caboclas. O donzel adolescente
era logo tido como maricas. Mesmo a
religiosidade das mães, irmãs e esposas não se rebelava, no geral, contra isso,
porque essa liberdade do homem se fazia aceita como uma característica inerente
a sua masculinidade. (ORTIZ, 1996, p. 64-65)
As atividades de lazer nessa sociedade
colonial estavam representadas pelos piqueniques e pelos passeios a cavalo ou
carroça, nas fazendas e nas ruas da Vila. Havia as quermesses e festas
religiosas nas diversas capelinhas da roça e nas capelas e igrejas da Vila,
promovidas pelas irmandades religiosas; além disso, os saraus e festas
noturnas, nas casas e fazendas, entre familiares e amigos, com música, canto e
dança. As idas as missas dominicais, as procissões, batizados, casamentos, e
festejos reais completavam o modo de vida dessa sociedade colonial.
Na vida das casas e fazendas coloniais, o
negro dava um toque de alegria que destoava do caráter taciturno de ibéricos e
caboclos. Ele alegrava com suas risadas, seus batuques, sua participação nas
festas religiosas, misturando seus cultos africanos com o catolicismo que
adotava a sua moda. Ele enriquecia o folclore dos sertões de Tabibaté, dando
uma rica coreografia a essas festas, notadamente, às folias de reis e folias do
divino. Os negros realizavam danças que se integraram definitivamente no
folclore regional, tais como o jongo
e o moçambique. Até algumas danças
de origem ameríndia sofreram processos de africanização. (ORTIZ, 1996, p. 66)
As festas de igreja eram as que
possibilitavam um maior contato social entre a população local, tanto pelos
aspectos de religiosidade, quanto por sua natureza de caráter profano,
convivendo ambas em estado de perfeita harmonia.
Num relato conciso, assim vivia o morador
da Vila de São Francisco das Chagas nos séculos coloniais. Fazia ele parte de
uma sociedade patriarcal, latifundiária e escravocrata, porém laboriosa e
tenaz, onde os próprios senhores das terras e suas famílias trabalhavam no
amanho das mesmas ou se lançavam em arriscadas empresas sertanistas pelas
regiões auríferas. Havia, àquele tempo, uma fundamental diferença entre o
dinamismo intrépido do patriarca das capitanias paulistas e o ócio de inúmeros
senhores de engenho nordestinos, tão bem retratados em crônicas contemporâneas.
(ORTIZ, 1996, p. 70)
Através desse conjunto de
atividades, em um misto entre o religioso e o profane, relacionados, direta e ou,
indiretamente à religiosidade peculiar do período colonial brasileiro, acabavam
por ditar as diretrizes comportamentais da sociedade, bem como da população
vila, pois consistiam em raras ocasiões em que as senhoras de família,
devidamente para os padrões da época, acompanhadas por uma ama ou pelas
próprias filhas, podiam ausentar-se em algum momento de suas residências, com
pretextos sempre ligados a participação em acontecimentos que na maioria dos
casos estavam ligados à Igreja.
1.2
Igreja e Sociedade: o papel das
irmandades na Taubaté Colonial
O poder civil ao longo da construção
histórica de diversas culturas em especial, a europeia, sempre esteve
suplantado no caráter religioso, de predominância católica apostólica romana,
no que diz respeito a influência do poder individual, que comandava, e dispunha
a ordem nas cidades e na sociedade. A Igreja sempre recebia os maiores
donativos, possuía números consideráveis de escravos, responsáveis pelas
grandiosas construções e reparos nos diversos templos da colônia brasileira. E
será nessa comunidade, que comercializava e ao mesmo tempo, por seu intermédio
equilibrava os poderes temporais da vida colonial, é que se acentuará o papel
fundamental de uma religiosidade extremamente enraizada no imaginário coletivo
do período, onde serão necessários grupos ideologicamente definidos e
separados, tendo a frente, a liderança dos primeiros parâmetros religiosos
frente os indivíduos.
É mais
precisamente no século XVIII que as irmandades no Brasil começam a se proliferar.
Revestidas pelo modelo português, tentavam se adaptar às condições locais.
Atividades como empréstimo de dinheiro a juros para os membros integrantes das
confrarias foram revividos no Brasil, primeiro por irmandades mais ricas,
constituídas por brancos representantes da elite local e depois copiada por
outras irmandades. (CÁSSIA, 2001, p. 6)
No decorrer do processo de colonização do
Brasil, iniciado em 1530, a Igreja Católica exerceu forte influência no
cotidiano dos primeiros povoadores, onde a herança cultural, legada pela coroa
portuguesa, através do Padroado Régio, pela qual os reis de Portugal e Espanha
detinham o controle não somente temporal, como o espiritual, agindo como
intermediadores da Igreja Romana em seus domínios.
Estreitamente sujeita ao poder civil, a
Igreja Católica, no Brasil, em particular, seguiu-lhe também estreitamente as
vicissitudes e circunstâncias. Em consequência do grão-mestrado da Ordem de
Cristo, sobretudo depois de confirmada em 1551 por sua santidade o papa Júlio
III, na bula Praeclara carissimi, sua transferência aos monarcas portugueses
com o patronato nas terras descobertas, exerceram estes, entre nós, um poder
praticamente discricionário sobre os assuntos eclesiásticos. (HOLANDA, 2008, p.
118)
Esse processo de influência cristã que delineou-se,
também, através das irmandades religiosas, que exerceram durante o período
colonial e imperial, um papel fundamental na sociedade, como elementos
aglutinadores das comunidades, em torno de um mesmo ideal, pautado no tripé ideológico
entre “Rei, Lei e Fé”, que orienta o os indivíduos dentro de uma comunidade
específica, divergindo brancos livres, mestiços e escravos.
Não só no período colonial, mas também
durante o Império, que manteve a tradição do padroado, as constantes intromissões
das autoridades nas coisas da Igreja tendiam a provocar no clero uma atitude de
latente revolta contra as administrações. (HOLANDA, 2008, p. 118)
Na maioria dos núcleos urbanos que
se desenvolveram no período colonial, sempre mantiveram a preocupação em criar
uma rede de edifícios e locais ligados à religião e à religiosidade.
Na colonização latino americana em geral e
brasileira em particular, a construção de igrejas e capelas tornou-se a marca
da conquista em dimensões nunca alcançadas na história anterior do
cristianismo. A maioria das construções religiosas do período colonial não
obedeceram principalmente as considerações de ordem pastoral, mas significaram
padrões de posse em nome do Império e garantia de domínio sobre índios,
franceses, holandeses e quilombolas... Daí o excesso de construções religiosas
verificado. (SODERO TOLEDO, 2001, p. 86)
Nesta “Terra sem males”, como era
denominada pela descrição do período colonial, os templos religiosos, corporificaram
a utopia de um paraíso terrestre. Determinaram os traçados urbanísticos de
nossas cidades, em uma didática própria para seus intuitos, que muitas vezes
feriram os poderes comerciais, políticos e legais, teatralizando assim, os
dogmas incompreendidos para a sociedade colonial, onde o templo religioso é o
símbolo central do poder divinizado o imaginário popular.
|
Nesse ano, Jacques Félix, o moço, cumprindo
determinações oficiais, “levantou a sua custa a igreja matriz, construída de
taipa de pilão, fez cadeia e casa de sobrado para conselho, moinho de trigo e
engenho de açúcar”. À medida que continuavam as penetrações das bandeiras e
foram intensificados os pedidos de sesmarias na área, Taubaté passou a
funcionar como “verdadeiro centro de irradiação do povoamento” de toda a
região. (MÜLLER, 1969, p. 14)
Inserido nesse contexto religioso na vila
de Taubaté existiu o chamado Convento Velho, que fora edificado em uma elevação
próximo a atual igreja de Sant’ana, construído para abrigar os frades
pertencentes a Ordem Primeira de Nossa Senhora do Carmo (Carmelitas) que
Jacques Félix trouxe consigo em sua comitiva nos primórdios da povoação, esse
convento legou um nome do rio que deslizava pela sua fronte, chamado Córrego do
Convento Velho.
Esse convento de frades carmelitas ainda
existia na última década do século XVII [...] Fora construído sobre a invocação
de Santo Antônio e passou a ser chamado de Convento
Velho após a edificação do Convento
de Santa Clara, de frades franciscanos, que teve início a partir de 1674.
(ORTIZ, 1996, p. 35)
Posteriormente,
no ano de 1674, através da iniciativa dos primeiros moradores da vila, solicitaram
a vinda dos primeiros frades franciscanos, receosos dos jesuítas, devido a sua
conduta protecionista para com o gentio, fonte primeira de lucro dos paulistas,
e conseguiram junto à Câmara de Vereadores, a doação do terreno e a ajuda
necessária para a construção de um novo convento, que se denominaria o Convento
de Santa Clara, distante aproximadamente, duzentos metros do traçado original
do perímetro urbano feito por Jacques Félix.
Frei Jerônimo, obtido da Câmara e povo, um
terreno para a construção e patrimônio do convento, em pouco tempo viu coroados
seus esforços; e em 1674 construiu o atual convento sob a invocação de Santa
Clara. [...] Posteriormente, por concessão pontifícia e régia, foi fundada a
Ordem Terceira Franciscana, para a qual logo os frades religiosos trataram de
introduzir as pessoas mais conceituadas do lugar pelo seu saber, pela sua
religião e fortuna, e assim conseguiram aqueles frades implantar no ânimo da
população sentimentos religiosos. (TOLEDO, 1976, p. 13)
Com o crescimento da vila,
subsequentemente aumentava sua população, e com isso, as aspirações religiosas
deram início ao surgimento das primeiras irmandades formadas por leigos, das
quais, as mais antigas foram formadas na igreja matriz. Como exemplo, a
Irmandade do Santíssimo Sacramento da Eucaristia, do Venerável Senhor dos
Passos, de São Benedito, de Nossa Senhora do Rosário, e da Ordem Terceira de
São Francisco da Penitência, onde também a princípio, funcionou na mesma igreja
matriz, a Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte e de Nossa Senhora do Pilar.
Nas igrejas e capelas coloniais, os altares
laterais serviam geralmente aos grupos e devotos particulares de diversos
santos que, entretanto, não chegavam a se constituir em irmandades; algumas
vezes porém, esses mesmos altares serviam às próprias irmandades, que
rivalizavam entre si na ostentação de decorações esmeradas, refletindo os
gostos e as posses de seus membros. (ANDRADE, 1991, p. 38)
As igrejas que eram construídas com o
patrocínio de uma irmandade, poderiam abrigar ao mesmo tempo, mais de uma confraria
em sua vivência comunitária, onde as principais irmandades eram conhecidas como
"associações de altar-mor", enquanto que as demais se abrigavam na
mesma igreja, por não possuírem patrimônio material suficiente para a
construção de seu próprio templo, ocupando altares laterais através dos quais,
os membros de sua confraria exerciam o "petitório", em louvor a seu
respectivo santo padroeiro, afim de edificar uma igreja de uso próprio. Como
exemplo dos ocorridos na Vila de Taubaté com a Irmandade de Nossa Senhora do
Rosário dos Homens Pretos e com a Irmandade de Nossa Senhora do Pilar, ambas
tendo sua origem na igreja matriz de São Francisco das Chagas.
Era comum haver mais de uma imagem do
orágulo, menores, e que eram levadas pelas ruas dos povoados e vilas, em
“petitório” entre a população, expostas em caixas apropriadas (oratórios) e
conduzidas por pedintes profissionais, pagos pelas irmandades, ou então por devotos
penitentes. (ANDRADE, 1991, p. 38)
Com a construção de uma capela própria
entre os anos de 1700 e 1705, a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos
Homens Pretos passou a ter seu próprio templo, desvinculando-se da igreja
matriz, o mesmo ocorreria alguns anos mais tarde com a Irmandade de Nossa
Senhora do Pilar e de Nossa Senhora da Boa Morte, que passaram a reunir-se em
uma capela de sua própria invocação, construída entre 1748 e 1760.
Durante os primeiros séculos de formação da
sociedade brasileira, o catolicismo exerceu total poder de coerção sobre
qualquer outra prática religiosa ou expressão cultural. Aspectos dessa
imposição da Coroa Metropolitana sobre a “estranha gente” foram constatados
desde a primeira cerimônia da posse da terra descoberta. O ritual era
predominantemente marcado por símbolos litúrgicos da Igreja Católica (HOORNAERT,
1978, p. 14).
As irmandades ou confrarias são regidas
basicamente por um compromisso, isto é, um regulamento que estabelece um
estatuto de sua própria organização, que deve ser de conhecimento de todos os
seus membros, cuja admissão é aceita perante juramento. Em sua composição
existe um corpo dirigente chamado Mesa Regedora, cujos chamados "irmãos de
Mesa" eleitos pelo grupo, detém o direito de sua administração. A Mesa
Regedora dessas irmandades e confrarias consiste dos seguintes componentes:
juízes, procuradores, escrivão, tesoureiro e zeladores. Em outras antigas
irmandades coloniais brasileiras como as irmandades de Nossa Senhora do
Rosário, São Benedito e de Santa Ifigênia, havia outros cargos de cunho não
administrativos como os de "rei e rainha", que possibilitavam grande
prestígio aos concorrentes que ocupavam seus cargos, considerados extremamente
honrosos.
No mercado de arte religiosa [...] o
público comprador era composto prioritariamente e predominantemente por
coletividades leigas, ou seja, pelas irmandades e confrarias. (BOSCHI, 1988,
p.35)
A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário
dos Homens Pretos congregava uma grande parcela da sociedade local, representada
na figura dos membros mais humildes, pois, constituíam-se de irmãos escravos,
ou quando livres, geralmente eram pobres, cujos papéis e funções estavam
voltados na promoção dos festejos anuais, geralmente realizados na primeira
semana de outubro, além da zeladoria de seu templo.
Os
estudiosos do assunto registram um grande número de irmandades de homens de
cor. As Irmandades do Rosário, trazidas pelos jesuítas, foram as mais numerosas
em todo o Brasil colonial, tradicionalmente divididas entre as de crioulos
(pretos nascidos no Brasil), mulatos e de africanos. Estas, como as demais
confrarias religiosas, estruturavam-se em torno de uma mesa presidida
obrigatoriamente por alguém da “raça”. Dentro dessa exigência, deveria ser
escolhido um juiz ou presidente, no caso das irmandades, e um prior no caso das
ordens terceiras. (CÁSSIA, 2001, p. 6)
Em outro contexto social, estava a
Irmandade do Santíssimo Sacramento da Eucaristia, cuja atuação estava
exclusivamente ligada aos centros urbanos, voltada para socorrer os
necessitados, de maneira especial os encarcerados, que naquele período não eram
mantidos pelo Estado, tendo dependência, na maioria das vezes, da caridade
popular para sua sobrevivência. Além disso, era de responsabilidade dos irmãos
do Santíssimo Sacramento da Eucaristia a incumbência da maior e mais
prestigiosa procissão anual realizada nas vilas e cidades coloniais, a chamada
Procissão do Corpus Christi. Composta exclusivamente por homens, representantes
da elite local, que vestiam suas opas vermelhas durante o culto religioso,
carregando as lanternas e o pálio ao longo das procissões eucarísticas.
A partir
do compromisso, lei que estabelece os estatutos da organização e da sua
aprovação pelas autoridades eclesiásticas, as associações leigas eram reconhecidas
no meio social. Era obrigação de todos os membros dessas confrarias seguir à
risca os seus mandamentos. Contavam como requisitos básicos na sua estruturação
a categoria sócio-econômica e a cor da pele. (CASSIA, 2001, p. 6)
A Irmandade de Nossa Senhora do Pilar no
Brasil colonial, exerceu considerada importância e representatividade. E na
Vila de Taubaté, onde a edificação de seu templo, dedicado à Virgem do Pilar demonstra
a mesma organização e desempenho de uma
confraria de devotos, onde ao final do século XVII e início do século XVIII, se
acentuou uma significativa participação de uma comunidade local.
A existência da Capela do Pilar deve-se ao
prestígio d o Licenciado Timóteo Corrêa de Toledo, cuja devoção de caráter
pessoal, que associado, à sua situação econômica na vila de Taubaté, permitiu
sua construção no perímetro urbano.
A veneração da imagem de Nossa Senhora do
Pilar prende-se, ao fervor religioso dos muitos castelhanos moradores de São
Paulo, em seus primeiros tempos. O culto de Nossa Senhora do Pilar teve grande
difusão por toda a capitania, estendendo-se mesmo até as mais remotas regiões
onde houve penetração bandeirista. (TOLEDO, 1976, p. 66)
A competência desse grupo, devoto a Nossa
Senhora do Pilar, consistia em manter basicamente os mesmos requisitos das
demais irmandades e confrarias locais, contendo sua Mesa Regedora, eleita por
seus próprios irmãos, renovando-se anualmente por meio de eleições diretas,
além das responsabilidades do culto e honra à sua padroeira e organização de
sua festividade anual, realizada no dia 12 de outubro.
Em Ouro Preto, uma de suas mais importantes
igrejas é a matriz de Nossa Senhora do Pilar; em Goiás existe na antiga cidade
de Pilar de Goiás, importante igreja dedicada a aquele orago – ambas de origem
bandeirista (TOLEDO, 1976, p. 66)
No mesmo templo funcionou também uma outra
confraria, dedicada ao culto à Nossa Senhora da Boa Morte, cujos festejos eram
celebrados anualmente no dia 15 de agosto.
A formação das irmandades religiosas
compostas por irmãos leigos teve seu ápice no decorrer do século XVIII, durante
o período barroco, cuja característica se dá pela suntuosidade e pela
ostentação, através das ornamentações dos templos e seus altares, quanto pela
exuberância de suas festas e procissões sempre concorridas e disputadas entre
si, onde o papel social exerceu sua dualidade de influências no imaginário
popular.
Não é de admirar-se que nessas condições o
homem de cor reagisse no Brasil exatamente como nos Estados Unidos e que
transformasse esse catolicismo do qual se queria fazer como um meio de controle
social e de integração numa sociedade que o maltratava, num instrumento, pelo
contrário, de solidariedade étnica e de reivindicação social. (CASSIA, 2001,
p.5)
1.3
A Devoção à Virgem Del' Pillar
De acordo com a tradição católica, o culto
à Virgem Maria está entre os mais difundidos no imaginário devocional popular,
que se conhece desde os tempos medievais por toda a Europa Meridional, com
maior profundidade na região da Península Ibérica.
O culto da Santíssima Virgem do Pilar se
conhece desde os tempos medievais em toda a Espanha, porém, mais
especificamente em Saragoça, onde sua festa principal se celebra com toda
solenidade, 12 de outubro. (ANDRADE, 1991, p. 87)
Consta que, no ano 40 da Era Cristã, o
apóstolo Tiago Maior foi designado pelos primeiros grupos cristãos para
divulgar a chamada "Boa Nova" (o Evangelho) por toda a região
conhecida hoje como Península Ibérica. Após ter percorrido diversas localidades
daquela região, esteve este em um pequeno vilarejo que, posteriormente, se
denominaria cidade de Saragoça, localizada às margens do rio Ebro (Espanha).
Conta-se, que certa noite, testemunhou uma aparição da Virgem Maria entre um
coro de diversos anjos querubins e serafins, sentada sobre um pilar de mármore,
em meio à ruínas de uma antiga edificação romana, de onde a Virgem lhe indicou
o local em que deveria ser construído um templo em sua honra. A pedido da
Virgem, o pilar foi conservado e, posteriormente, colocado no interior do
templo erguido, pois desta maneira ela permaneceria abençoando o vilarejo desde
então.
Segundo a mesma tradição cristã, foi essa
a origem da manifestação da Nossa Senhora Del' Pillar, ou em português, Nossa
Senhora do Pilar, sendo reconhecida como uma das primeiras “aparições” dela no
decorrer do processo histórico de que se tenha conhecimento.
Tornando-se a padroeira oficial da
Espanha, a devoção à Nossa Senhora Del' Pillar foi amplamente difundida
alcançando também as colônias da América espanhola, embora em Portugal mesmo
durante o período da União Ibérica (1580-1640), sua devoção não fosse
conhecida.
Nas colônias portuguesas, como no caso do
Brasil, seu culto tem início em Salvador (BA), nos primórdios de 1690, no Convento
das Carmelitas, onde, posteriormente, lhe foi edificado um templo particular,
que viria a ser uma das mais antigas e importantes igrejas da cidade. Nos
atuais estados do Nordeste brasileiro, a devoção à Nossa Senhora do Pilar foi
se difundindo em diversas igrejas e capelas que lhe foram dedicadas. Já nas
capitanias paulistas, desde o século XVII, habitava um número considerável
populacional de origem espanhola, através do qual, o culto à Virgem do Pilar
foi, por essa mesma razão, difundido não somente nas regiões centrais como
também, nos pontos mais longínquos de penetração das bandeiras e passagens dos
tropeiros, em exemplo, a Vila de São Francisco da Chagas.
Assim, são encontrados templos dedicados à
Virgem do Pilar, em Ouro Preto, cujo nome original foi Vila Rica de Nossa
Senhora do Pilar de Ouro Preto; Mariana, Sabará, São João Del Rei, Furquim,
Antônio Dias, e outras cidades de Minas Gerais; em Goiás, na cidade de Pilar e
também nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. (ANDRADE, 1991, p. 88)
Em Taubaté, a devoção à Nossa Senhora do
Pilar iniciou-se com Timóteo Corrêa de Toledo,
dedicado à uma pequena imagem doméstica, levou-o a custear as obras de
edificação e ornamentação de seu templo. Esse culto de caráter particular teve
origem em reminiscências de sentimentos de características nacionalistas
espanholas de seus antepassados devotos de Nossa Senhora do Pilar, o título de
padroeira oficial daquele dito país.
1.4
O Barroco Mineiro na Vila de Taubaté:
arquitetura e construção
O movimento artístico denominado Barroco
surgiu como uma manifestação cultural, caracterizando-se como uma reação
estética à Reforma Protestante (1545-1563), realizado durante o Concílio de
Trento.
Ora, o barroco representa, na teoria de
Wölfflin, um dos temas maiores de uma estética dualista, conquistando foros não
só de forma legítima, mas ainda de passo essencial à própria evolução da arte.
A acusação de monstruosidade inverte-se, dando lugar a uma conceituação
hipervalorizada, sobre a qual se funda, aliás, uma nova definição de história
da arte, que passa a ser a história das formas consideradas em si mesmas e da
evolução permanente dos estilos. [...] Desde logo, o barroco é tido como o
segundo e último termo de uma série estética irreversível e fatal, cujo termo
inicial seria o clássico e, muito embora no desenvolvimento da teoria os dois
conceitos adquiram progressiva amplitude e generalidade. (MACHADO, 1978, p. 85)
Surgido na Europa, precisamente na Itália,
ao final do século XVI, em continuidade ao Renascimento, o Barroco teve sua
manifestação de maneira tardia em terras brasileiras, já em pleno século XVIII,
onde representava a elaboração estética concebida pela Igreja Romana, de modo a
inspirar e despertar a devoção através de sua magnitude artística.
Tornada em consenso pelos estudiosos o
berço do barroco por manter firme influência e reunir artistas de várias
nacionalidades, a Itália onde outrora florescera o Renascimento, tornava-se
agora também centro de origem da arte barroca. Inclusive, era desejo do papado o
patrocínio de obras de arte em escala cada vez maior, a fim de tornar Roma a
mais exuberante cidade de todo o mundo cristão. [...] Neste ínterim,
especialmente a arquitetura barroca, encontrava em uma aristocracia faustosa
meios de difundir-se, entre o fim do século XVII e inicio do século XVIII pela
França, Alemanha, Áustria e Boêmia. (SOUZA-SANTOS, 2001, p. 3)
A "arte barroca" tem por
característica um estilo artístico e decorativo, onde, seus aspectos consistem
na predominância do exagero de formas e rebuscamento nos adornos de resultados
esplendorosos. Na América portuguesa e espanhola, o movimento barroco tem como
principais características a busca por planos grandiosos, o triunfo de linhas
curvas, a exuberância de ornamentos de particular tendência para esculturas de
movimentos, somados à dramaticidade teatral da cena retratada com efeitos
reforçados pelo intenso uso do claro-escuro, tanto em plano arquitetônico,
pictórico ou escultórico.
No século XVIII os artistas italianos eram
principalmente soberbos decoradores de interiores, famosos em toda a Europa por
sua habilidade no trabalho de estuque e por seus grandes afrescos, que podiam
transformar qualquer salão de um palácio ou mosteiro num cenário de riqueza
espetacular. (GOMBRICH, 1999, p. 443)
O Barroco brasileiro teve um estilo
próprio nas produções artísticas e literais no decorrer dos séculos XVII, XVIII
e início do XIX, começando a ser introduzido na região litorânea na medida em
que crescia a própria colonização do território brasileiro com a edificação das
primeiras cidades, como exemplo, São Salvador (BA-1549), marcando todo o
programa arquitetônico e ornamental de igrejas e conventos, seguindo
rigorosamente o modelo português, de maneira que representasse uma transposição
de influências para o continente brasileiro.
Se é verdade que a arquitetura é uma
obstrução da paisagem, aqui, nessa paisagem deslumbrante, padres, arquitetos e
artistas tiveram que concorrer com os espaços ilimitados que enchiam os olhos
europeus, viciados em horizontes menores e rimas de impérios passados. Foram
reverentes a esse cenário e criaram diminutas capelas e igrejas, pérolas
barrocas postas nas selvas verde-azuladas, cultivando em seus interiores
florestas de madeira de lei recobertas de ouro. Ingressar nesses templos é
fazer uma viagem dentro da nossa alma barroca em busca de arroubos, expondo
nossa intimidade em praça pública, características do temperamento brasileiro.
(TIRAPELI, 2001, p. 10)
O Barroco Mineiro segue também em linhas
gerais, em um estilo peculiar, como um desmembramento do Barroco, caracterizado
pela exuberância do elemento ornamental na decoração interior das igrejas, com
uso intenso da talha dourada e policromada pela tendência a movimentação e
encurvamento das formas arquitetônicas, além do realismo das composições
escultóricas e presença de elementos ornamentais profanos, como os
"atlantes e as cariátides" ao lado de elementos simbólicos religiosos
como anjos e querubins.
A distância do litoral e as dificuldades de
importação de materiais e técnicas construtivas vão dar ao Barroco de Minas
Gerais um caráter peculiar, que possibilita a criação de uma arte diferenciada,
marcada pelo regionalismo. A formação urbana das vilas mineiras e a fé
intimista, em que cada fiel se relaciona com seu santo protetor, viabilizam uma
forma única de expressão, que se define como gosto artístico, e mais do que
isso, como um estilo de vida. (PINTO, 2006, p. 19-20)
Dentre os principais intérpretes da arte
barroca está o arquiteto e escultor mineiro natural da antiga Vila Rica (atual
Ouro Preto), Antônio Francisco Lisboa, chamado "o Aleijadinho" (c.
1730-1814), que teve entre muitas obras arquitetônicas a igreja de São
Francisco de Assis em Ouro Preto, destacando-se como sua obra prima. Na pintura
decorativa de interior de igrejas, nenhum outro artista sacro superou Manuel da
Costa Ataíde (1762-1830), que teve dentre suas concepções, a figura de Nossa
Senhora da Porciúncula Mulata, decorando o teto da nave da igreja de São
Francisco de Assis, em Ouro Preto.
Estilo próprio das produções artísticas e
literárias do Brasil no século XVII, XVIII e princípios do século XIX, cuja
expressão principal é a arquitetura e escultura sacra, de que foi intérprete
máximo Antônio Francisco Lisboa, dito o Aleijadinho. (ANDRADE, 1991, p. 42)
Em São Paulo, devido à proximidade das
Gerais, soube-se captar com dileta perfeição influências da produção artística
do Barroco Mineiro, que fora adequada às diversas possibilidades locais,
denominada produção Colonial Paulista.
Do alto da Serra do Mar os bandeirantes
povoaram o sertão, duplicando o território brasileiro. Seguiram os caminhos
fluviais guiados pelos índios, até descobrirem as minas de ouro. Por onde
andaram deixaram as marcas de sua arquitetura feita com taipa de pilão no
sertão; no litoral, suas construções eram em pedra, seguindo a tradição
portuguesa. [...] Pode-se sentir um fio condutor em todos os conjuntos
arquitetônicos, seja no litoral, seja no planalto. Internamente, as igrejas
foram decoradas com retábulos ou altares em madeira, cujas características
configuram, podemos já dizer, uma morfologia própria dos retábulos paulistas.
(TIRAPELI, 2003, p. 21)
O Rococó surgido na França durante o
reinado de Luís XV (1710-1774), surtiu grande referência na arte barroca
brasileira, onde, referiu-se a um estilo denominado "Barroco-Rococó".
Caracterizando-se pelo uso exagerado das curvas e formas assimétricas, além da
intensidade dos elementos decorativos estilizados pelos mais diversificados
modelos, como: concha, ramagens, laços, flores. Todos utilizados de formas
abusivas tendenciado a uma maneira rebuscadamente exagerada e de gosto
duvidoso, mesmo assim, considerado na época como uma arte de requinte e
elegância.
O rococó surgiu portanto como um estilo
essencialmente ligado ao desenvolvimento das chamadas “artes decorativas e
ornamentais”, firmando-se primeiramente nesse setor para estender-se depois à
arquitetura externa dos edifícios. Seus mentores foram arquitetos-decoradores e
ornamentistas, principais responsáveis pelas mudanças estilísticas na base de
uma evolução formal, abrangendo grosso
modo oito décadas, entre 1690 e 1770 aproximadamente. (OLIVEIRA, 2003, p.
25-26)
No Brasil, o Rococó teve predomínio na
decoração interior de residências, posteriormente, sendo utilizado também na
ornamentação de templos religiosos. A princípio, sua introdução acontece em
Minas Gerais, entre os anos de 1760 e 1770, com cerca de cinquenta anos de
atraso em relação ao contexto europeu.
Tratar do Barroco no Brasil é associá-lo a
participação das irmandades e confrarias, cuja rivalidade entre si acabava por
financiar as produções artísticas, como no caso de Minas Gerais, com as
diversas construções e ornamentações de templos, também com o uso abundante de
ouro, finalizando assim, o custear dos caprichos dessa sociedade.
[...] A principal prova está no imenso
número de novas construções religiosas nesse período, devidas a maior parte à
iniciativa das associações laicas conhecidas pelos nomes de confrarias,
irmandades e ordens terceiras. Apesar de ter tido suas expressões mais
características na região de Minas Gerais, que não conheceu fundações
conventuais por proibição expressa do governo português, o desenvolvimento das
irmandades setecentistas é um fato marcante também no Rio de Janeiro,
Pernambuco e outras regiões brasileiras já enquadradas pela Igreja Católica no
século precedente. (OLIVEIRA, 2003, p. 167)
Em Taubaté, de influência barroca, temos a
capela de Nossa Senhora do Pilar, construída em pleno século XVIII, com padrões
artísticos, arquitetônicos e decorativos das influências do Barroco
predominantes nas cidades mineiras.
De maneira artística, a Capela do Pilar
representa em sua totalidade, um testemunho humilde, porém, de grande
significado da arte barroca, cujo ouro e riqueza das Minas Gerais, em seu
apogeu, pode subsidiar na Vila de Taubaté, consistindo-se de uma singular e
exclusiva representação dessa arte no Vale do Paraíba, onde, a Capela do Pilar
torna-se a única edificação religiosa desse porte que se tem conhecimento em
todo o estado de São Paulo, cujas linhas arquitetônicas são tipicamente de
caráter mineiro, acentuando-se no estilo barroco, digerindo das demais igrejas
e capelas de São Paulo, durante o mesmo período.
Trata-se de um raro exemplo de capela com
planta poligonal, com similares apenas em Minas e na cidade de Goiás. A
tradição das capelas poligonais, no entanto, remonta à construção da de Garcia
d’Ávila, na costa baiana, que se disseminou para as capelas de engenho de
açúcar da região. Em São Paulo existe ainda, com esse modelo, a igreja do
Mosteiro da Luz e da Ordem Terceira da Penitência, no Largo de São Francisco,
ambas creditadas ao beato Frei Galvão, natural de Guaratinguetá, (TIRAPELI,
2003, p. 270)
O Mosteiro da Luz caracteriza um
modelo semelhante ao encontrado na Capela do Pilar, acentuando a importância das
tradições de construção em estilo poligonal, muitas delas oriundas da
influência exercida durante o início da colonização.
De forma simples, suas linhas
arquitetônicas devem-se ao estado de pobreza predominante nas regiões de São
Paulo, em detrimento às demais regiões da colônia brasileira com a acentuada
falta de recurso por parte dos paulistas, tanto para a mão de obra
especializada, quanto a aquisição de materiais necessários para os diversos
trabalhos de elaboração, construção e ornamentação.
As residências bandeiristas, suas vilas com
casas simples, capelas, igrejas e conventos construídos em barro – na técnica
conhecida como taipa de pilão – são frutos da luta mestiça que, nessa região
isolada, soube pacientemente construir uma cultura de contato entre povos
nativos, colonizadores ibéricos, africanos e imigrantes. (TIRAPELI, 2003. p.
26)
A Capela do Pilar teve sua construção
iniciada através de uma escritura de concerto, promessa e obrigação firmada
pelo seu idealizador e licenciado, Timóteo Corrêa de Toledo, para com o mestre
de obras Francisco Veloso de Aguiar, a cinco de junho de 1748, onde, o término
da construção não fora documentada, sendo sua ornamentação interna,
principalmente do altar mor, baseada em Francisco Xavier de Brito, conhecido
entalhador mineiro, cuja influência pode ser notada.
Embora a Capela do Pilar, em seu conjunto,
apresente uma arquitetura e decoração muito modestas, se comparadas a outras do
mesmo período, principalmente as de Minas Gerais e da Bahia, ainda sim forma um
monumento arquitetônico bastante expressivo do estilo barroco, com
manifestações de sua última fase, o Rococó, introduzido na Capitania de São
Vicente já tardiamente, em meados do setecentismo (séc. XVIII). (ANDRADE, 1991,
p. 55)
Seus aspectos arquitetônicos e decorativos
tratam-se de um raro exemplar da arquitetura mineira, assemelhando-se à outras
capelas das Gerais do mesmo período, como a de Nossa Senhora do Ó, em Sabará, e
a igreja de Santo Antônio, em Caeté.
Figura 12 - Altar lateral direito
da Capela de Nossa Senhora do Pilar, 2011; Taubaté - SP; Glauco Rodrigues;
FONTE: Acervo pessoal.
|
2. O CONSTRUTOR
2.1
Acertos para a edificação da capela
Timóteo Corrêa de Toledo, que era um homem
devoto de Nossa Senhora do Pilar, ajudou a difundir na Vila de São Francisco
das Chagas de Taubaté o culto à referida Virgem Maria.
Com esse objetivo solicitou, em 1747,
licença à Cúria de São Paulo. A construção da ermida foi autorizada pelo
documento adiante transcrito, passado pelo bispo D. Bernardo Rodrigues Nogueira
em 19 de dezembro desse ano. (ORTIZ, 1996, p. 713).
Documento esse cujo texto se segue:
“O exmo. D. Bernardo Rodrigues Nogueira, por mercê de Deus e da Santa Sé
apostólica, primeiro bispo de S. Paulo e do conselho de S. Majestade.
Aos
que esta provisão virem, saúde e benção.
Fazemos
saber que atendendo ao que Timóteo Correa de Toledo nos representou por sua
petição, dizendo que, para maior culto e veneração da imagem de N. S. do Pilar
da vila de Taubaté, queria fazer-lhe a capela de rossio da mesma vila, fazendo
a despesa pela quantia de 500$000 (quinhentos mil réis) que havia em dívidas,
as quais ele tinha feito segurar, além de 92$000 (noventa e dois mil réis) que
dois devotos queriam dar de esmola, e do mais que pretendia tirar pelos fiéis
para a ereção da dita capela, pedindo-nos por fim e conclusão de seu
requerimento nos dignássemos mandar passar provisão para o dito efeito,
concedendo ao suplicante a administração da mesma capela.
E
sendo por nós visto o seu requerimento e as informações que sobre ele temos, e
atendendo ser tão pio e para maior honra e culto da mesma Senhora, havemos por
bem dar faculdade e conceder licença para que possa fundar e erigir a capela
dedicada a N. S. do Pilar, como se nos suplica, com cláusula que será no lugar
mais alto, para decência dela e comunidade de fregueses, cuja eleição fará e
reverendo pároco com o suplicante e as pessoas principais da freguesia, de que
se fará termo por todos assinado, que será remetido à nossa Câmara e mandamos
sob pena de excomunhão maior e duzentos cruzados, que nenhuma pessoa
eclesiástica ou secular ponha escudo de armas ou quaisquer outras insígnias ou
letreiros nos portais, paredes ou em outra parte de dentro ou de fora da dita
capela, sem especial licença nossa ou de nossos sucessores por escrito.
Dada
nesta cidade de S. Paulo, sob nosso sinal e selo a 1º de dezembro de 1747 – Bernardo,
bispo.” (ANDRADE, 1991, p. 91)
Para efeito resolveu edificar uma capela
em terreno de sua propriedade, de localização na esquina denominada Rua Direita
(atual Rua Visconde do Rio Branco), cuja transversal à Rua dos Gil, que
receberia posteriormente, o nome de Travessa de Nossa Senhora do Pilar (atual
Rua Bispo Rodovalho). Ambas as ruas formariam um largo, que daí por diante, se
denominaria Largo de Nossa Senhora do Pilar (atual Praça do Convênio).
Para mostrar um aparente fervor religioso,
o indivíduo não media recursos. A sua vaidade e exibicionismo de sua
generosidade faziam dele um contribuinte permanente das receitas financeiras
das irmandades. (BOSCHI, 1988, p. 36)
Essa provisão uma vez que obtida por
Timóteo Corrêa de Toledo, o mesmo firmou contrato com o mestre de obras
Francisco Veloso de Aguiar a cinco de junho de 1748, redigido pelo tabelião
Policarpo de Abreu Nogueira, com o propósito de dar início imediato às obras de
construção da capela.
Documento esse cujo texto segue:
“Escritura
de Conserto, Promessa e Obrigação que faz Francisco Veloso de Aguiar a Timóteo
Correa de Toledo e esse àquele, pela feitura da obra de N. Sa
do Pilar por preço de 250$000 (duzentos mil réis).
Saibam
quantos este público instrumento de conserto, promessa e obrigação virem que,
no ano do nascimento de N. S. Jesus Cristo de mil setecentos e quarenta e oito,
aos cinco dias do mês de junho do dito ano, nesta vila de S. F. das Chagas de
Taubaté, em minha residência, eu tabelião adiante nomeado, apareceram Francisco
Veloso de Aguiar, oficial de carpinteiro e bem assim o licenciado Timóteo
Correa de Toledo, ambos moradores nesta dita vila e reconhecidos de mim pelos
próprios de que trato, do que dou fé entre si consertados, comprometidos e
obrigados, dos quais pelo dito licenciado, Timóteo Correa de Toledo me foi
dito, em presença das testemunhas adiante nomeadas e assinadas, que ele, como
protetor que é nomeado da Capela de N. Sa do Pilar desta vila, que queria
erigir, se havia ajustado com o dito oficial, Francisco Veloso de Aguiar e
ajustar as paredes da igreja que se hão de fazer de taipa de pilão de
quarta-feira de cinzas do ano de mil setecentos e quarenta e nove, que ambas
hora vier até serem acabadas de fazer para a mesma igreja todas as portas
necessárias de almofadas, janelas com zelozias de esteira e as frestas, coro e
arco da capela-mor com curiosidade, três altares com nichos lisos com frisos,
forro nas paredes dos altares e painéis por cima curiosos, arco da capela-mor
para o trono forro em painéis da dita capela-mor, trono de seis degraus e
sacristia assoalhada com caixão de gavetas e os coninhos para guardar
ornamentos, fábrica, dois púlpitos, dois confessionários, e bancos necessários,
duas pias, o tamanho da igreja quanto parecer conveniente; e tudo assim dar
acabado dentro de um ano e meio (1750), depois do dia já assinalado dando-lhes
armadeiras correntes, isto é, prontas para delas se fazerem as tais obras no
lugar delas e madeirando toda a igreja com caibros limpos a enxó que hão de ser
três sobre frexais da mesma forma em madeira da capela-mor e contrata tudo por
preço de duzentos e cinquenta mil réis, metade que já lhe havia dado e a outra
metade no fim; e outrossim mais de fazer na dita igreja sua torre de pedras
sobre as paredes dela que sobre a porta se hão de levantar, a cuja pessoa e
bens presentes e futuros, feita que seja a dita obra e dar-lhe para esta as
madeiras correntes, a qual ele oficial, com selos de mestre-carpinteiro, disse
toma-os e prometia fazê-lo como fica dito por ele protetor quanto ao que
pertence ao seu ofício e assistir e ordenar o mais das paredes, tudo dentro do
dito tempo e pelo referido preço de duzentos e cinquenta mil réis, dos quais
por haver recebido os cento e vinte e cinco declarados e os outros achariam
feita a obra que, não fazendo ele assim, como fica nesta declaração, assim como
por feita como na presteza e poderia ele, protetor, mandar fazer reparar a
custa dele mestre-carpinteiro respondiam por sua pessoa bens presentes e
futuros sem que em todas nem em parte deixar fiado nesta nem do que toca a seu
ofício, como a outro preço na dita experiência, que tenha que disso pedir maior
preço sem achar-se enganado com o justo nem da mesma forma ele protetor pela
obra assim feita poder alegar menor valia dela que o preço justo entre eles
nesta declaração que todos prometeram cumprir na parte que lhes toca, como nela
se declara o ainda com todas as mais formas a seguir as circunstâncias em
direito requeridas para maior firmeza dela que todas coagiram nula sem condição
como só delas expressa menção fizessem com as circunstâncias mais requeridas em
direito.
Em fé
do que lhes fiz este instrumento, que ambos assinaram, e eu como pessoa pública
estipulante e aceitante a esta passei e aceitei em nome de quem por direito me
aqui tocar, pessoas presentes e ausentes, que tendo-lhes em presença das
testemunhas Miguel Pinheiro de Rezende e Guilherme Moreira, moradores nesta
vila, meus conhecidos, assinaram com eles, do que dou fé eu Policarpo de Abreu
Nogueira, tabelião.” (ANDRADE,
1991, p. 92-93)
Todavia, os prazos previstos para o
término da construção não foram cumpridos, tanto que em relatos no ano de 1757
decorridos sete anos além do prazo previsto, a capela ainda estava em
construção, de acordo com e registro de autoria do vigário Pe. Joaquim da Bessa
Passos, que descrevia o estado físico da capela naquele período publicado seu
testemunho em 1877 na obra “História do município de Taubaté” de autoria do Dr.
Francisco de Paula Toledo:
A Capela de Nossa Senhora do Pilar, na
cidade de Taubaté, é feita de taipa de pilão, coberta de telha vã, e ainda se
continua na factura dela, porém, pela sua disposição indica que há de ter um
altar-mor, dois colaterais com seus corredores por uma e outra banda da capela,
e sua sacristia por trás do altar-mor, feito de material da mesma capela, em
tudo à romana. (TOLEDO, 1976, p. 19-20)
Por volta de 1760, a capela teve seu
estágio de construção parcialmente concluído. Em 1759, Timóteo Corrêa de Toledo
enviuvou e se ordenou sacerdote nos primeiros anos da década de 1760,
permanecendo zelador da capela até a data de seu falecimento, sendo sucedido
por um de seus filhos, o padre Bento Cortês de Toledo.
2.2
Timóteo Corrêa: “homem bom” da Vila de
Taubaté
Favor fazer uma observação do significado de
homem bom no Brasil colônia, nas notas de rodapé.
Fundador da Capela de Nossa Senhora do
Pilar, ficou conhecido como “homem dos três trintas”; conforme registro do
Prof. Paulo Camilher Florençano: “...ele vivera noventa anos, dos quais, os
trinta primeiros, em estado de solteiro, os trinta seguintes, casado, e os
trinta restantes, tendo enviuvado, como padre...”.
A Capela do Pilar foi fundada por Timóteo
Corrêa de Toledo, nascido em Taubaté, em 1699 ou 1703, da antiga, tradicional e
importante família paulista dos Toledo e Piza, descendente dos Condes de
Oropeja e dos Duques de Alba e Tormes, da Espanha. (ANDRADE, 1991, p. 73)
Era o segundo filho do capitão João Vaz
Cardoso e de sua esposa, Dona Francisca de Freitas Cortes, nasceu na Vila de
São Francisco das Chagas de Taubaté em 1699. Descendia dos Toledo e Piza pelo
lado materno, sendo bisneto de D. Simão de Toledo e Piza, que era um nobre
espanhol. Ainda pelo lado materno era sobrinho neto do bandeirante taubateano
Carlos Pedroso da Silveira, que, juntamente com outro taubateano, Antônio
Rodrigues Arzão, descobriram oficialmente as primeiras pedras de ouro nos
sertões de Cuiaté (atual Caeté/MG) entre os idos de 1693, onde por essa razão,
posteriormente, foi nomeado provedor da Casa de Fundição do Ouro instalada pela
Coroa em Taubaté no ano de 1695.
A oficina de fundição e quintos de Taubaté,
que tão importante papel representou no grande ciclo, foi a primeira a fundir e
a quintar todo ouro extraído das minas e não a de Paraty e das Minas, como asseveram
alguns autores. Paraty teve fundição depois extinta aquela e Minas só veio a
tê-las em 1719. (MARTINS, 1973, p. 73)
Dedicado aos estudos, Timóteo Corrêa de
Toledo possuía o título de Licenciado, grau que recebeu, embora não tivesse
cursado nenhuma universidade, naquele período somente poderia ser obtido na
Europa. Na Vila de Taubaté, exerceu o cargo de vereador por diversas
legislaturas..
[...] residiu alguns anos na Vila de São João D’El Rei (MG). Foi vereador
em Taubaté e depois de viúvo (1759) resolveu seguir a carreira sacerdotal,
entrando para o seminário São Joaquim, no Rio de Janeiro, onde ordenou-se padre
no início da década de 1760. Exerceu a atividade sacerdotal por cerca de vinte
e cinco anos, em Taubaté e em Pindamonhangaba, onde foi coadjuntor e vigário;
faleceu em 1788. (ANDRADE, 1991, p. 74)
Assim como a grande maioria dos chamados
“homens bons” dessa sociedade colonial, Timóteo Corrêa de Toledo, com
poderes econômicos vigentes no período, onde homens de posses acabavam por
deter as lideranças da comunidade em que estavam inseridos.
Por meio de semelhante padronização das
formas exteriores da cordialidade, que não precisam ser legítimas para se
manifestarem, revela-se um decisivo triunfo do espírito sobre a vida. Aramado
dessa máscara, o indivíduo consegue manter sua supremacia ante o social. E,
efetivamente, a polidez implica uma presença contínua e soberana do indivíduo.
(HOLANDA, 2008, p. 147)
Sobre Timóteo, é importante destacar
algumas partes essenciais de um documento existente no Arquivo Histórico de
Taubaté, datado de 1744, atestando seus antecedentes para elucidar sua
idoneidade perante o contexto sócio histórico do período; que diz:
Juizo Ordinario/Anno –
1744 – Taubathe Escrivão – Botelho
Autuasam de petisam em
que quer vista com odeduzi
do nella olicensiado Timo
thio Correya detoledo
Anno do nasimento denoco
Senhor Jezu Cristo demil esete centos equarenta ecoatro aos oito dias do mês de
agosto do dito Anno nesta desam francisco das chagas de Taubathe em cazas de Morada de mim
Tabaliam ao diante nomeado sendo ahi (foi ouvido) olisensiado Timothio Correya
detoledo epor elle me foy dito eoferesido apetison iunta com odespacho do uis
ordinário Euzebio daCunha Souza para efeito de selhe emquerer em testemunhas
queria dar oque pellapetisam tinha exposto eu Tabaliam otomei eautuei que he
tudo ao que aodiante sesegue de que fis este autuamento eu Antonio Gomes
Botelho Tabaliam que o escrevy
Diz Timothio Correa de
Tolledo mor e natural desta vª de Taubaté q pª bem de sertos
Reuqerintºs q tem perante sua Magde q Deos Guarde lhe he necessario
justificar os Items seguintes citados o procurador deste concelho pª dizer
aella setiver, q contra dizer
1º Que osupptº he natural
vª filho Legitimo do Capam João vas Cardozo, e desua mer
Francª de Freytas neto por parte paterna de João vas daCunha, e desua mer
Da Anna Ribrº Pedroza, e por parte materna do Capam Amaro
Gil Cortes, e de sua mer Marianna de Freytas.
2º Que todos estes forão
pessoas principais deste povo, e dos antigos povoadores desta vª, e nella como
na Cide de S. Paulo serviram os cargos honrosos dos Republicas como
de Juis e veriador, e almotaceis, e homes actos, e prontos entodos o Real
Serviço, e com distinção notoria por dependerem de autoridade como dos
Tolledos, Freytas, eCunhas cujas caszas e sulares em suas notoralidades sam
Reconhecidas, e elles por serem Legitimos descendentes delas como se declara
por serias, q disso tem emais papeis autênticos.
3º Que foram, e sam
pessoas Reconhecidas por christauns velhos por q o Pay doSuppte he
familiar dosanto officio donumero dos daCide do Rio de Janrº, e tem
alvara de Privilegios Reziztados nos LLos desta Camera donde sérvio
duas vezes de Juis Ordinrº, e outras mtas deveriador, e mais cargos
q sempre serviu com mta autoride e inteireza Regulhandoce
porelle os acertos dobem pço, e Real.
4º Que seo bisavo D. Simão
de Tolledo e Piza castelhano viera pª a Cide de Sam Paulo da Ilha 3ª
provido pello conde donatario no cargo de Cap. Mor e Governador, Juiz de Orfãos
Proprietario cujos cargos
sérvio honrozamte naquelle tempo
5º Que hu neto dosobre
dito D. Simão, e Tio do Sppte chamado D. Simão de Toledo e Piza
sérvio o cargo de Ouvidor Geral e Corregedor da Comca de Sam Paulo
confirmado por sua Magde que Deos Guarde por provisão do Gor
desta Capitania.
6ª Que nesta vª de Taubate
servio de Provedor dos Reais quintos no principio das Minas Gerais hu Tio do
Suppte primo com Irmão do seu Pay o qual foy o mestre decampo Carlos
Pedrozo da Sylveyra, e na dita ocupação fes serviços abem da Real fazenda
eCoroa como consta de vários papeis Revistados nos LLos das cameras
desta Comca
7ª Que todos estes
antepassados doSuppte e elle mesmo sempre se trataram a Ley da
nobreza mantendo cavalos, e armas sem q já mais nelles se achou operação ou
officio mecânico
8ª Que nestas famílias hâ
sacerdos de Todas as Relegions ocupados em denidades, e cargos
eclesiasticos sendo seo Tio oDor Gaspar Gonçalves de Araujo Daym,
evigro Geral no Bispado do Rio de Janrº e comicario doSanto officio
9ª Que omesmo Suppte
servindo de vereador nesta vª dispor a formalide e com todo ozello
se ouve nas Recadacoins, e Remeças a otizoureiro, ehe concultado emCamera pª
todos os acertos della com Respeito e autoridade por sua mta
inteligência, e verdades as matérias
10ª Que ele Suppte
é cazado com Ursula Izabel de Mello tam
Tambem de acendentes
nobres, e destinos por estantes noservico Real, e da acendensa dos Mellos
eCabrais de que há brazão e armas nesta vª e sobrinha neta de Maria deMiranda
D. viuva mer Legitima, q foy de João Pires de Brito Cappam
de Infantaria, e com nomeramto deSargto Mor nas
conquistas do gram Para, Meranham, e Seará servindo a sua custa mais de vinte e
sinco annos cujos soldos selhe devem athe hoje de q ella sem herdeyros forçados
fes doação e perfilhoação no Suppte
P. av. M. seja servido inquirir
osobre do por pessoas principais, e das q soem andar na Republica
citado orpocurador do concelho pa as verjurar ejusteficando oq baste
mandarcelhes passar os treslados em forma pa seus documento
E. R. M. (ORTIZ, 1996, p. 708-712)
Casou-se com Dona Úrsula Isabel de Mello,
em 1735. Pai de oito filhos, sendo eles, Carlos, Luiz Vaz, Maria Ana, Antônio
Manuel, Bento Cortez, Ângela Mariana e Joaquim José; três dos quais, se
tornariam sacerdotes.
Com a morte de sua esposa, em 1759,
Timóteo Corrêa decidiu tornar-se sacerdote, ele que já possuía entre seus
filhos, três padres: Pe. Carlos Corrêa de Toledo, Pe. Bento Cortez de Toledo e
Frei Antônio de Santa Úrsula Rodovalho. Dos filhos de Timóteo Corrêa de Toledo,
quatro se casaram, os outros filhos homens seguiram a vida religiosa.
2.3
Os Toledo Piza: do sagrado ao profano
Na sociedade colonial brasileira, a
“instituição familiar”, não diferentemente dos tempos atuais, detinha o papel
predominantemente de modelo de formação das características de seus indivíduos,
visto que, no delinear do século XVIII, a égide em que estavam fundamentados os
valores familiares das diferentes camadas sociais, se encontravam
intrinsicamente ligados aos parâmetros de uma sociedade essencialmente
patriarcal, onde os aspectos culturais e econômicos estabeleciam a
diferenciação entre os indivíduos e aos grupos aos quais eles pertenciam.
Nos primeiros séculos da colonização, a
organização familiar e a vida doméstica não poderiam deixar de ser
influenciadas por alguns dos elementos que marcaram profundamente a formação da
sociedade brasileira e o modo de vida de seus habitantes. [...] a falta de
mulheres brancas, a presença da escravidão negra e indígena, a constante
expansão do território, assim como a precariedade de recursos de toda sorte de
produtos que estavam acostumados os colonos no seu dia-a-dia, são apenas alguns
componentes que levaram a transformação de práticas e costumes solidamente
constituídos no Reino, tanto no que se refere à constituição das famílias, como
os padrões de moradia e hábitos. (NOVAIS,
1997, p. 84-85)
Através desse panorama a família Toledo e
Piza estabeleceu seus princípios dentro da ótica dos padrões culturais da
sociedade colonial brasileira, onde eram mantidos os aspectos de afirmação de
pertencimento a um grupo distinto e delimitado pelos padrões e valores
consanguíneos bem como econômicos, em contraste aos demais indivíduos,
estabelecendo naturalmente, uma ordem hierárquica, em que cada um tinha o seu
papel no contexto social vigente.
Seria talvez plausível relacionar tal fato
a sugestão de que o uso do simples prenome importa em abolir psicologicamente
as barreiras determinadas pelo fato de existirem famílias diferentes e
independentes uma das outras. Corresponde à atitude natural aos grupos humanos
que, aceitando de bom grado uma disciplina da simpatia, da “concórdia”, repelem
as do raciocínio abstrato ou que não tenham como fundamento, para empregar a
terminologia de Tönnies, as comunidades de sangue, de lugar ou de espírito.
(HOLANDA, 2008, p. 148)
Dos membros da família Toledo Piza, havia
distinção entre as características individuais de seus componentes.
D. JOÃO DE TOLLEDO E PIZA, o primeiro
ancestral dos Tolledos Pizas de São Paulo citado por Pedro Taques, era legítimo
descendente, sem quebra por bastardia, da ilustre casa dos condes de Oropejae
dos duques de Alba de Tormes, pertencendo assim a mais fina aristocracia
espanhola. Natural de Tormes, contraiu ele núpcias, em Madrid, com D. Anna de
Castelhanos, da qual teve, em fins do segundo quartel do século XVI: D. SIMÃO
DE TOLLEDO PIZA. (ORTIZ, 1996, p. 18)
Capitão Amaro Gil Cortez (avô): morador da
Vila de Taubaté, exerceu funções de juiz Ordinário e juiz de Órfãos, casado com
dona Marta Rodrigues de Miranda.
Seu pai João Vaz Cardoso, descendente da
família paulista Cunha Gago, onde sua mãe dona Ana Ribeiro Rodovalho, era filha
da fidalguia espanhola representada por seu pai, D. Simão de Toledo Piza,
primeiro membro da família a chegar ao Brasil, instalando-se na Vila de São
Paulo de Piratininga, onde lá se casou com D. Maria Pedrozo, em fevereiro de
1640.
D. Simão de Toledo Piza era bisavô de
Timóteo Corrêa de Toledo, estava entre os povoadores da Capitania de São Paulo.
Sabe-se que quatro filhos desse casal vieram posteriormente, residir na Vila de
São Francisco das Chagas de Taubaté, na segunda metade do século XVII, sendo
eles: João Vaz Cardoso, Vasco Fernandes Rodovalho, Pantaleão Pedroso de Toledo,
e dona Maria Pedroso.
Bandeirantes, índios, ouro, tropas de
muares, comércio de beira de estrada, coragem, heroísmo, lendas e estórias
dinamizaram os primeiros tempos desses núcleos que marcaram e povoaram os
caminhos do Vale do Paraíba e as terras das Minas Gerais. (MAIA, 1977, p. 7)
O capitão João Vaz Cardoso, pai de Timóteo
Corrêa de Toledo, foi um morador da Vila, ocupando-se de cargos como, vereador
na Casa da Câmara Local, inclusive como seu presidente, além de exercer as
funções de Juiz Ordinário e, peculiarmente, o cargo de Familiar do Santo
Ofício. De seu casamento com a taubateana D. Francisca de Freitas Cortez,
nasceram oito filhos, dentre os quais, destacam-se: Tenente João de Toledo
Piza, André Corrêa de Toledo, Ana de Toledo Piza, Mariana de Toledo, Frei Simão
de Toledo, Maria de Toledo Cortez. Pelo lado paterno, Timóteo Corrêa de Toledo
era bisneto de D. Simão de Toledo Piza. E pelo lado materno era sobrinho-neto
do bandeirante taubateano Carlos Pedroso da Silveira, que participou em 1693 de
uma bandeira liderada por outro taubateano chamado Antônio Rodrigues Arzão,
onde no mesmo ano descobriu oficialmente as primeiras jazidas de ouro nos
sertões de Cuiaté, atual Minas Gerais.
Dentre os membros da família Toledo,
destacam-se algumas figuras, de maneira especial, os filhos de Timóteo Corrêa
de Toledo:
Frei Rodovalho como era conhecido, iniciou seus
estudos religiosos no convento de Santa Clara em Taubaté, e concluiu no
mosteiro de São Francisco, na cidade de São Paulo à 10 de novembro de 1762. Dedicado
ao sacerdócio, além de orador sacro e professor, possuiu uma carreira eclesiástica.
Em 1805, possuía o cargo de ministro da Província
Franciscana do Rio de Janeiro, e conseguiu lograr a posição de pregador régio e
confessor da rainha D. Maria I, depois da vinda da família imperial em 1808. Em
1810 foi sagrado bispo de Angola, renunciando ao cargo posteriormente, e
faleceu em 02 de dezembro de 1817.
Um fato curioso que consta posteriormente em jornais
do final do século XIX, a cerca de uma visita do imperador D. Pedro II à cidade
de Taubaté, em que o mesmo ao visitar a capela do Pilar, se deparou com uma
pintura a óleo do referido bispo Rodovalho, cujo relato se descreve dessa
maneira:
Ao saber que havia na capela do Pilar um
retrato antigo do frei Antônio de Santa Úrsula Rodovalho, D. Pedro II quis
visitar a igreja. Chegando lá indagou aos que o acompanhavam: “’O que este
homem faz aqui? Este foi um brasileiro ilustre, foi o confessor de minha avó’ –
Responderam então a S. M. que a Igreja do Polar fora construída por Timoteo
Corrêa de Toledo, pai do bispo Rodovalho, ambos taubateanos” (Correio do Vale
do Paraíba, 28 de dezembro de 1945, p. 5). Ao observar a pintura existente na
capela do Pilar, lembrou que ela tratava-se de uma cópia da pintura original
então presente no Convento de Santo Antônio do Rio de Janeiro; porém a cópia de
Taubaté, datada de 1871, não agradou ao Imperador, que a achou defeituosa (JORNAL CORREIO
PAULISTANO, 20 de outubro de 1886, p. 2).
Outro filho de Timóteo Corrêa de Toledo,
foi Pe. Carlos Corrêa de Toledo Piza e Mello, nascido em 1736. Escolhendo a carreira
religiosa, fez seus estudos em Lisboa, mais tarde vindo ao Brasil acabou por
ocupar o cargo de vigário colado da vila de São José do Rio das Mortes, arraial
fundado em 1702, pelo bandeirante Thomé Portes D’El Rey, que mais tarde se
denominaria a cidade de Tiradentes – MG.
Com início do movimento da Inconfidência
Mineira, no ano de 1789, teve atuação importante frente aos principais líderes
do movimento.
Com o fracasso do movimento, foi preso na
madrugada de 23 de maio de 1789, na vila de São José D’El Rey, por ordem de D.
Luís Antônio Furtado de Castro do Rio de Mendonça, 6º Visconde e 1º Conde de
Barbacena, então Governador e Capitão-Geral do Brasil. Após a prisão, foi
enviado para o Rio de Janeiro, juntamente com outros implicados. Foi acusado de
aliciar novos adeptos à causa, declarando dispor de elementos brancos e negros
dos escravos para combater as tropas do governo português não apenas em São
José do Rio das Mortes, mas também em Taubaté em outras vilas paulistas,
estando encarregado de fornecer montarias e munição para os inconfidentes. Foi
condenado, a 18 de abril de 1792, juntamente com os demais inconfidentes, tendo
todos os seus bens confiscados. Por ser padre, sua sentença foi mantida em
segredo, por ordens reais [...] Todavia, por interferência de seu irmão, Frei
Antônio de Santa Úrsula Rodovalho, diretamente à Rainha D. Maria I de Portugal,
de quem era confessor, esta sentença foi comutada em degredo perpétuo, a ser
cumprido em Lisboa, onde faleceu. (ANDRADE, 1991, p. 79-80)
Dos irmãos Toledo, que se fixaram na vila
de Taubaté, deixaram uma numerosa descendência, dando origem a inúmeras
famílias. Ao longo da história, a família Toledo deteve poderes econômicos,
onde além de edificar a Capela do Pilar, foi ela a proprietária de muitos outros
bens, inúmeros terrenos, bem como construiu a primeira Capela de Sant’Ana.
Existia na antiga rua de Sant’Ana um
pequeno oratório particular da família Piza. A Câmara Municipal desejando
alargar a rua de São José até sair no largo de Sant’Ana desapropriou o terreno,
em que estava esse pequeno oratório, e então no ano de 1866, deu-se princípio à
edificação de uma pequena capela, a qual está hoje concluída; é ela dirigida
pela irmandade de Sant’Ana. (TOLEDO, 1976, p. 27)
A Capela de Sant’Ana, corresponde também
as iniciativas que a família Toledo demonstravam perante ao contexto religioso
e representativo na sociedade local, onde sua existência contrastavam-se com a
edificação mais elaborada como da Capela do Pilar, tendo como única semelhança
o fato de serem edificadas pela mesma família e em terrenos de propriedade da
mesma.
Dessa forma, podemos traçar um panorama
demonstrativo de dualidades entre “sagrado e profano” em uma determinada
contextualização sócio cultural cuja família se fazia presente na nítida
expressão da formação histórica da vida cotidiana no Brasil colonial.
3.
a Capela do Pilar e suas projeções
3.1
O Pilar de Taubaté: memória e sociedade
A memória da capela do Pilar traz para a
sociedade taubateana fatos e indivíduos que possibilitaram retomar os fatos que
a constituíram ao longo da historiografia local, como fontes para a valorização
do processo histórico pelo qual a capela esteve inserida em diversos períodos
da história.
Segundo o Prof. Paulo Camilher Florençano em
sua monografia sobre a capela do Pilar, não se tem conhecimento da existência
de registros ou documentos contemporâneos aos primeiros anos de existência da
Capela do Pilar, que descrevam suas atividades como templo religioso [...]
Sabe-se que Timóteo Corrêa de Toledo, após ter se ordenado padre [...]
permaneceu como zelador a Capela do Pilar até sua morte, em 1788. (ANDRADE,
1991, p. 95)
Esse
aspecto caracteriza uma das particularidades inerentes à figura dos
idealizadores da capela do Pilar como Timóteo Corrêa de Toledo e sua família,
que foram os primeiros nomes a dar início aqueles fatos que relatamos
anteriormente. Timóteo foi sucedido após sua morte por um de seus filhos, Pe.
Bento Cortez de Toledo, que também viria a ser uma personalidade na sociedade
tauateana. Após sua morte, a capela passou a ser de responsabilidade do coronel
Vitoriano Moreira da Costa, que foi o último Capitão-Mor da vila de Taubaté,
onde ele foi sepultado no interior da própria capela do Pilar, ao lado de outro
personagem, o Cônego da Capela Real e Imperial, D. Antônio Moreira da Costa,
que faleceu em 1833.
Como nas demais igrejas remanescentes do
período colonial, houve sepultamentos no interior do templo, característicos
das tradições que ocorriam por todo o Brasil. Através dessa premissa foram
encontrados por ocasião dos trabalhos de restauração realizados pelo SPHAN
(Serviço do Patrimônio Histórico Artístico Nacional) entre 1945 e 1949, dois
achados que viriam a ressaltar a importância da capela do Pilar , bem como os
indivíduos que nela construíram suas raízes, tanto na participação religiosa,
quanto política frente à sociedade.
“Em dias da semana finda, ao cavar-se o
piso do corredor lateral à Capela-mor; à direita desta, o cavoqueiro sentiu o
chão mais fofo, o que aliás, já observara em outros lugares, mas, por
curiosidade, aprofundou a escavação. A cavadeira partiu metal, uma chapa de
prata. E, então, com todo o cuidado, prosseguiu até descobrir ossadas, duas
chapas de prata, e puxadores do mesmo metal, dos quais dois de cabeça de leão e
um de delicada mãozinha. Estavam parafusados a restos de tábuas de cedro e eram
feitos artisticamente.” Uma das chapas de prata, de formato quadrado,
apresentava a seguinte inscrição: AQUI JAZ O R. V. ANTÔNIO MOREIRA DA COSTA
CÔNEGO DA CAPELA IMPERIAL 1833. A outra chapa, de formato ovalado, continha os
seguintes dizeres: AQUI JAZEM OS RESTOS MORTAIS DE VITORIANO MOREIRA DA COSTA,
NASCIDO E 30 DE JULHO DE 1791, E FALECIDO AOS 20 DE JULHO DE 1872. (JORNAL NOSSA TERRA, 10
de fevereiro de 1946, p. 2)
As
inscrições achadas referiam-se ao antigo vigário da igreja matriz de São
Francisco das Chagas, Cônego Antônio Moreira da Costa, que foi capelão da
guarda de honra do príncipe regente, D. Pedro de Alcântara. A outra referia-se
ao último capitão-mor da vila de Taubaté, Vitoriano Moreira da Costa, que
juntamente com seu irmão, o Coronel Manuel Marcondes do Amaral, e seu primo, o
Coronel Manuel Marcondes de Oliveira e Mello, o primeiro Barão de
Pindamonhangaba, aderiram a causa da independência do Brasil, tendo especial
participação nos acontecimentos políticos do país, juntamente com o Imperador
D. Pedro I.
Através
dessa família, a sociedade taubateana contribuiu ao longo do tempo, diversas
benfeitorias à causa pública e econômica, que nem sempre estavam voltadas a
princípio a esse propósito, mas o processo histórico o fez, por assim dizer.
Dentre os principais nomes estão os do Comendador Francisco Gomes Varela, e o
de Maria Leopoldina Marcondes Varela, importantes cafeicultores de Taubaté e do
Vale do Paraíba, cujo parentesco era o de D. Francisca de Paula Marcondes de
Matos, “D. Chiquinha da Mattos” (1854-1927), que foi uma ilustre dama da
sociedade taubateana.
[...] Destacada por sua caridade e
benemerência, desenvolveu intensa atividade filantrópica na cidade, tendo
dentre outras ações, doado o primeiro aparelho de Raios X ao Hospital Santa
Isabel. Em reconhecimento ao seu importante trabalho de assistência social
voluntário, a Câmara Municipal de Taubaté decidiu homenageá-la postumamente,
atribuindo seu nome a uma das ruas centrais da cidade aquela que segue e
continuação à rua Bispo Rodovalho. (ANDRADE, 1991, p. 97)
Na
segunda metade do século XIX, na capela do Pilar, outro personagem, se tornaria
marcante na memória da sociedade taubateana, o Cônego Benjamim de Toledo Mello,
que era bisneto de Timóteo Corrêa de Toledo, nascido em Taubaté em 23 de maio
de 1833, tinha significativa participação na vida pública como sacerdote, tanto
no Brasil quanto no exterior recebendo, em 1874, do Rei de Portugal, D. Luís I,
o título de Cavaleiro da Real Ordem Militar Portuguesa de Nosso Senhor Jesus
Cristo.
Em 1870, por iniciativa do mesmo cônego, foram
executados melhoramentos na capela do Pilar.
No ano de 1870, por iniciativa do reverendo
cônego Benjamin de Toledo Melo, um dos descendentes de Timóteo Corrêa de
Toledo, foram feitas às expensas de muitos devotos, vários melhoramentos da referida
capela. (TOLEDO, 1976. p. 20)
Vale
ressaltar que Timóteo Corrêa de Toledo assegurou tanto para si quanto para sua
descendência, a zeladoria da capela, que vai terminar com o último zelador
chamado Jordão Gomes Nogueira, em meados da década de 1940, onde a capela do
Pilar funcionava com certa regularidade como templo de atividades religiosas
integradas ao calendário litúrgico da igreja Catedral de São Francisco das
Chagas.
Um
dado até o presente, pouco conhecido e delineado, na historiografia taubateana,
é o fato de que, em meados de 1885, funda-se em Taubaté, a 1ª Conferência
Vicentina, sob a invocação do Sagrado Coração de Maria, que tinha como sede, a
capela de Nossa Senhora do Pilar.
Funda-se
em Taubaté a Sociedade São Vicente de Paulo com
a 1ª conferência que recebeu o nome de Sagrados Corações de Jesus e Maria. Com
sede na Igreja Nossa Senhora do Pilar. “Para socorro a doentes e necessitados e
visando fundar um Asilo de Mendigos”. É eleito Presidente o Dr. Gastão Câmara
Leal. (JORNAL O nORTE DE 23/8/1918, p. 3; Diário de Taubaté de 12/03/1898, P. 2; e JORNAL O Lábaro de 05/03/1939, P. 1)
Dentre os primeiros confrades fundadores da
Conferência de São Vicente em Taubaté, destacavam nomes como do próprio cônego
Benjamin de Toledo Melo, além do Monsenhor Antônio Nascimento Castro, Dr.
Gastão Câmara Leal, Lorenço Monteiro, Joaquim Gomes de Araújo e Monssenhor
Claro de Melo.
A
Sociedade São Vicente de Paulo de Taubaté realiza reunião na igreja do Pilar,
sua sede, sob a presidência de D. José Pereira da Silva Barros, bispo de
Olinda. A sociedade sustenta 16 famílias pobres com 48 pessoas. (JORNAL DIÁRIO PAULISTA DE 12/05/1888, p.3)
Através
desses relatos descritos nos diversos jornais, podemos constatar o quanto a
capela do Pilar desempenhava, de maneira ativa, seu papel religioso na
sociedade taubateana, principalmente durante o período em que a Sociedade São
Vicente exercia lá suas atividades.
Após
solene tríduo encerra-se hoje na Igreja do Pilar a festa de São Vicente de
Paulo, havendo missa e comunhão. À tarde sessão magna no Salão Pio X na
Associação Artística e Literária. (JORNAL O NORTE DE
19/07/1914, p.4)
Dentre
os acontecimentos ocorridos na história de Taubaté, entres eles, um dos outros
de maior destaque foi a realização do Convênio do Café de Taubaté, próximo a
capela do Pilar, em fevereiro de 1906, durante o governo do presidente
Rodrigues Alves. Taubaté acabou por sediar o encontro dos três maiores
produtores de café do Brasil, as províncias de São Paulo, representada por
Jorge Tibiriçá, de Minas Gerais, com Francisco Salles, e Rio de Janeiro por
Nilo Peçanha. Este evento pretendia garantir a valorização do café, guiado pelo
controle de sua produção, a taxação de preços para o mercado interno e
exportação, além do apoio financeiro dos produtores.
Bôas
vindas! Hoje á tarde Taubaté, a cidade lendária dos bandeirantes, a terra de
Jacques Felix, recebe em seu seio hospitaleiro tres presidentes de Estado, que,
afim de assignar um convenio sobre a valorisação do café, escolheram-n’a para
tal solenidade. (JORNAL DE TAUBATÉ, 25/02/1906, p.
1)
Taubaté
foi a cidade escolhida, para a realização desse evento, por sua localização privilegiada
no Vale do Paraíba.
O “Convênio do Café” foi realizado no
antigo casarão, que pertenceu a Dona Maria Leopoldina Marcondes Varella,
localizado na esquina das ruas Visconde do Rio Branco com Bispo Rodovalho,
paralelo à Capela do Pilar, a construção do século XIX que naquela época servia
de sede para a Prefeitura Municipal, Câmara Municipal, Fórum, Cartórios e
Delegacia de Polícia. Como marco desse importante acontecimento do início do
século, a pequena praça em frente à Capela do Pilar recebeu o nome de “Praça do
Convênio”. (ABREU, 1991, p. 62)
Isso
contribuiu para dar visibilidade ao patrimônio não só material como
imaterial.
3.2 O
Pilar de Taubaté: patrimônio e cultura
O
patrimônio histórico poder ser definido como um bem material, natural ou imóvel
que possui significado e importância artística, cultural, religiosa, documental
ou estética para a sociedade. Esses patrimônios foram construídos ou produzidos
pelas sociedades passadas, por isso representam uma importante fonte de
pesquisa e preservação cultural.
Patrimônio histórico. A expressão designa
um bem destinado ao uso fruto de uma comunidade que se ampliou a dimensões
planetárias, construído pela acumulação contínua de uma diversidade de objetos
que se congregam pelo seu passado comum: obras e obras-primas das belas-artes e
das artes aplicadas, trabalhos e produtos de todos os saberes e savoir-faire dos seres humanos. Em nossa
sociedade errante, constantemente transformada pela mobilidade e obqüidade de
seu presente, “patrimônio histórico” tornou-se uma das palavras chave da tribo
midiática. Ela remete a uma instituição e a uma mentalidade. (CHOAY, 2006, p.
11)
Como
um bem material, a capela do Pilar, a partir de meados de 1941, organizou um
movimento em favor de seu tombamento histórico. Ressaltava-se assim, o quanto ela
era necessária e significativa para a sociedade local, bem como para a própria
preservação da sua construção e do seu uso pela população, que viessem a manter
viva a memória desse patrimônio social.
Esse movimento culminou com o
encaminhamento de um documento de representação ao então diretor do Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), Dr. Rodrigo Mello Franco de
Andrade, contendo os propósitos do pretendido tombamento histórico. A exposição
de motivos desse documento, além de conter dados históricos sobre a Capela,
trazia descrição de sua importância como representante da arquitetura colonial
bandeirista, um dos poucos ainda existentes na região valeparaibana. (ANDRADE,
1991, p. 99)
A
representação que fora encaminhada ao SPHAN teve rápida acolhida pelo arquiteto
Luís Saia, membro delegado do SPHAN, na região de São Paulo e Paraná no
período, onde ele vistoriou a capela e, em seguida elaborou um laudo técnico
sobre a viabilidade de se proceder ao tombamento histórico, conforme
solicitado. Todo esse esforço resultou em um amplo processo em que o desenrolar
do tempo ditava as preocupações referentes à preservação do patrimônio
arquitetônico histórico, pois estava relacionado à necessidade de se preservar
a memória dos acontecimentos bem como a memória coletiva da sociedade.
Mesmo um lugar de aparência puramente
material, como um depósito de arquivos, só é lugar de memória se a imaginação o
investe de aura simbólica. Mesmo um lugar puramente funcional, como um manual
de aula, um testamento, uma associação de antigos combatentes, só entra na
categoria se for objeto de um ritual. Mesmo um minuto de silêncio, que parece o
extremo de uma significação simbólica, é, ao mesmo tempo, um corte material de
uma unidade temporal e serve, periodicamente, a um lembrete concentrado de
lembrar. Os três aspectos coexistem sempre [...]. É material por seu conteúdo
demográfico; funcional por hipótese, pois garante ao mesmo tempo a
cristalização da lembrança e sua transmissão; mas simbólica por definição visto
que caracteriza por um acontecimento ou uma experiência vivida por pequeno
número uma maioria que deles não participou. (NORA, 1993, p.21-22)
Com
isso, em 1944, foi homologado e aprovado, pelo então Presidente da República,
Sr. Getúlio Dornelles Vargas, o pedido de tombamento histórico da Capela de
Nossa Senhora do Pilar, que reconheceu nela um importante exemplar do
patrimônio histórico e artístico nacional.
Ao tombamento histórico, seguiram-se
diversas fases de restauração da capela, que contaram sempre com o apoio e
interesse do povo taubateano e a efetiva participação da Prefeitura Municipal e
da Cúria Diocesana de Taubaté. O processo de Tombamento Histórico da Capela do
Pilar, também foi muito bem registrado pelo Prof. Paulo Camilher Florençano, em
sua monografia. (ANDRADE, 1991, p. 99)
Por
mais de 200 anos, a Capela de Nossa Senhora do Pilar passou por diversas intervenções,
sofrendo vários reparos, consertos e até algumas modificações. Essas
modificações que alteraram o estilo próprio da capela ocorreram todas na fase
anterior ao seu tombamento, onde simplesmente foram retirados os elementos
artísticos que não compunham sua estrutura original. Pois, a preservação dos
bens de valor histórico, sejam de natureza material ou imaterial, são
portadores de referência à identidade, à ação, e à memória dos diferentes
grupos que construíram a sociedade ao longo do processo histórico.
[...] A especificidade do monumento deve-se
precisamente ao seu modo de atuação sobre a memória. Não apenas ele a trabalha
e a mobiliza pela mediação da afetividade, de forma que lembre o passado
fazendo-o vibrar como se fosse presente. Mas esse passado invocado, convocado,
de certa forma encantado, não é um passado qualquer: ele é localizado e selecionado
para fins vitais, na medida em que pode, de forma direta, contribuir para
manter e preservar a identidade de uma comunidade étnica ou religiosa,
nacional, tribal ou familiar. (CHOAY, 2006, p.18)
Deve-se
ressaltar que, desde a década de 1940, após ter sido tombada pelo então
denominado SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico Artístico Nacional), de
maneira particular, a capela do Pilar deixou de ser utilizada para o culto
religioso, passando então a ser um espaço cultural da cidade. Porém, mesmo assim,
as intempéries do tempo, acabavam por comprometer sua estrutura física, já que
a mesma passava por vários períodos com as portas fechadas.
Em 1980 o Cônego Evaristo Campista César
entregou as chaves da Capela à Divisão de Museus, Patrimônio e Arquivo Histórico
Municipal, solicitando que fosse feita uma nova restauração, devido à
existência de inúmeras rachaduras nas paredes internas e externas da capela,
bem como a precariedade do estado de seu madeiramento, o que estava
comprometendo seriamente a construção [...] Em maio de 1982, o então
vice-Prefeito, Sr. Moacyr Freire, foi investido no cargo de Prefeito Municipal
de Taubaté, por renúncia de seu titular. A 20 de outubro daquele mesmo ano foi
remetido um projeto de lei à Câmara Municipal, solicitando a abertura de um
crédito de Cr$ 500.000 (quinhentos mil cruzeiros) destinados ao início das
obras de restauração da capela enquanto não viessem os recursos do governo
federal, prometidos pelo SPHAN para o ano seguinte. (ANDRADE, 1991, p. 102)
Todo
esse processo de reparo na estrutura da capela do Pilar foi se desenvolvendo
através de uma série de períodos em que era necessária constantemente uma
supervisão por parte dos poderes públicos para não comprometer mais a estrutura
original. Isso aconteceu até meados de 1985 com a criação do Museu de Arte
Sacra. No entanto, nem o poder público nem a sociedade se comprometeram com a preservação da
memória tanto com a edificação quanto às imagens sacras lá instaladas.
Os lugares de memória nascem e vivem do
sentimento que não existe memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que
é preciso manter os aniversários, organizar as celebrações, pronunciar as
honras fúnebres, estabelecer contratos, porque estas operações não são naturais
[...]. Se vivêssemos verdadeiramente as lembranças que eles envolvem, eles
seriam inúteis. E se em compensação, a história não se apoderasse deles para
deformá-los, transformá-los, sová-los e petrificá-los eles não se tornariam
lugares de memória. É este vai-e-vem que os constitui: momentos de história
arrancados do movimento de história, mas que lhe são devolvidos [...]. (NORA,
1993, p. 13)
O
patrimônio histórico como um bem cultural vai adquirir seu significado mais
primitivo, atrelado à origem do termo grego pater,
que significa “pai” ou “paterno”. De tal forma em que o patrimônio venha
relacionar-se com tudo aquilo que é deixado pela figura do pai e transmitido
para seus filhos. Com o passar do tempo essa noção de repasse acabou sendo
estendida a um conjunto de bens materiais que estão intimamente relacionados
com a identidade, a cultura, o passado e a coletividade, o que é pertinente em
relação à esta nossa pesquisa.
Nesse
contexto, a memória cultural da capela do Pilar vai se desenvolver amplamente
através da criação do Museu de Arte Sacra pela Mitra Diocesana de Taubaté, em
meados de 1985. Com a criação do Museu, ocorreu a intensa migração de imagens
sacras para o espaço físico da capela. Temos assim uma mudança de propósitos,
porém necessária para a sobrevivência desse importante marco arquitetônico.
Essa
nova função reafirmará os novos objetivos assumidos pela antiga capela, agora
Museu de Arte Sacra, conforme podemos constatar do relato contundente da
cerimônia de inauguração deste museu.
Exposição “IRMANDADES E CAPELAS” que precederá ali, a
instalação do MUSEU DE ARTE SACRA instituição permanente, programada pela
Prefeitura Municipal de Taubaté, Mitra Diocesana de Taubaté e SPHAN
pró-Memória.
A cerimônia que terá início às 18:30h do dia 23 de
dezembro de 1985, será abrilhantada pela participação do coral da Escola de
Música e Artes Plásticas “Maestro Fêgo Camargo”, que, sob a regência da
maestrina Neide Silva Áureo Soares, executará duas peças sacras do século XIX,
selecionadas do acervo do Arquivo Histórico Municipal pelo pesquisador, maestro
Régis Duprat: “Matinas”, seguidas do “Primeiro Responsório do Ofício de
Quinta-Feira Santa”, do maestro Antônio Penzo, compositor que residiu nesta
cidade a partir do século XIX.
Os corais da cantatas – “Oh! Face Amortecida” e “Jesus
– Alegria dos Homens”, de Johan Sebastian Bach, com acompanhamento de órgão,
finalizando o programa.
Taubaté, 340º ano da elevação à categoria de Vila”.
Engo José Bernardo Ortiz Prefeito Municipal
D. Antônio Afonso de Miranda Bispo Diocesano
Arquito Antônio Luís Dias Andrade Diretor do SPHAN
Prof. Eduardo de Mattos Ortiz Diretor do DEC
Prof. Paulo Camilher Florençano Diretor do DMPAH
(ANDRADE,
1991, p. 106 – Relato da exposição de instalação do Museu de Arte Sacra)
Dessa
maneira ainda hoje podemos ressaltar o papel determinante que os setores públicos,
privados e eclesiásticos acabam por ter, no estabelecimento de regras em favor
da manutenção e da preservação do patrimônio material, bem como do patrimônio
cultural, pois devem ser garantidos os meios de acesso aos símbolos que remetem
às memórias e experiências de um povo através de seu patrimônio que de maneira
concreta, se fez e se faz, com o registro de sua identidade material preservada
indelével, frente aos avanços do tempo, da perversidade, da especulação e da
falta de fiscalização quanto à sua preservação, quando da ocupação desenfreada
de camelôs no local.
Podem tratar-se de um monumento, de uma
personagem, de um museu, de arquivos, bem como de um símbolo, de um evento ou
de uma instituição, mas nem tudo se caracteriza como lugar de memória, para
isso o documento, o evento, o monumento etc., deve possuir uma vontade de
memória, deve ter na sua origem uma intenção memorialista que garante sua
identidade, o que os constitui é um jogo da memória e da história, uma
interação dos dois fatores que leva a sua sobredeterminação recíproca, sem essa
vontade os lugares de memória são lugares de história. Lembrando que memória e
história não são sinônimas e que as mesmas se opõem em tudo, sendo que a
memória é a vida, sempre alcançada pelos grupos viventes [...], ela está em
evolução permanente [...], inconsciente das suas deformações sucessivas [...].
A história é a reconstrução sempre problemática e incompleta daquilo que não é
mais [...]. A memória é um absoluto e a história não conhece outra coisa que
não o relativo (NORA 1993, p. 9)
Através
da memória a sociedade pode valorizar e revalorizar um bem tombado que é
símbolo que “fala” à cidade sobre sua história.
3.3 O
Pilar de Taubaté: imaginário esquecido
Em
1944, a capela foi definida como “joia rara da arquitetura colonial”, em seu
tombamento. Apesar disso, atualmente ela se encontra fechada desde 2009, com a
transferência, através da decisão da Diocese de Taubaté, do Museu de Arte Sacra
para a nova sede da Cúria Diocesana. O que registramos com pesar, pois essa
atitude foi tomada sem ampla discussão com a sociedade, o que resultou em mais
um exemplo como tantos outros, de negligência em relação a um bem tombado, não
um bem qualquer – o que empobrece a cultura e tradição da sociedade por causa da
excessiva valorização do capital material em detrimento do cultural.
Por outro lado, a conservação dos edifícios
(monumentos, grandes equipamentos e outros) tem lugar, necessariamente, in situ. Ela provoca dificuldades técnicas
muito diferentes. Está na dependência do domínio público e político, envolve
mecanismos edílicos, econômicos, sociais, psicológicos complexos, que geram
conflitos e dificuldades. (CHOAY, 2006, p. 52)
Pois
estando fechada, a capela do Pilar se deteriorará
rapidamente, ao longo do tempo. Sua trajetória histórica atualmente, já não é
mais tão conhecida pelos habitantes locais, bem como sua própria visualização, enquanto
monumento à memória da identidade regional taubateana.
Sua
conservação e valorização são fatos que merecem uma maior repercussão pública,
diante dos formadores de opinião acerca do patrimônio material e imaterial de
Taubaté, transcendendo a visão acadêmica e direcionando-se também, as diversas
classes sociais, políticas, ideológicas e religiosas.
Compreender essa atitude reacional exige
que se diferencie o vandalismo ideológico das outras formas de destruição do
patrimônio histórico [...] Os atos privados de vandalismo pertencem, no mais
das vezes, ao cortejo tradicional dos desvios que acompanham os períodos de
agitação social. (CHOAY, 2006, p. 106)
Com
isso, é necessário traçarmos novas perspectivas para os diversos patrimônios
históricos regionais, em especial a capela do Pilar para com a sociedade
taubateana; onde devemos avaliar as possibilidades de inserção física do
patrimônio, no imaginário coletivo, fazendo assim, a interação da história na
atualidade mediática, onde a falta de valores ideológicos da cultura e da
memória dos indivíduos, se acentuam mediante as forças da globalização. Onde não
apenas compete primeiramente ao historiador, ao pesquisador, a comunidade
acadêmica e aos poderes públicos, a responsabilidade de possibilitarem a
aproximação entre seus símbolos, e as identidades as quais eles representam,
mas a toda sociedade.
Cada indivíduo é parte de um todo – da
sociedade e do ambiente onde vive – e constrói, com os demais, a história dessa
sociedade, legando às gerações futuras, por meio dos produtos criados e das
intervenções no ambiente, registros capazes de propiciar a compreensão da
história humana pelas gerações futuras. A destruição dos bens herdados das
gerações passadas acarreta o rompimento da corrente do conhecimento,
levando-nos a repetir incessantemente experiências já vividas. Atualmente, a
importância da preservação ganha novo foco, decorrente da necessária
consciência de diminuirmos o impacto sobre o ambiente, provocado pela produção
de bens. A preservação e o reuso de edifícios e objetos contribuem para a
redução de energia e matéria-prima necessárias para a produção de novos. (Ghirardello-Spisso,
2008, p. 15)
Se
analisarmos a participação da sociedade, mediante os resultados concretos dos
grupos envolvidos na preservação do patrimônio, verificaremos que os avanços
são tímidos, dessa forma, as políticas públicas e privadas em prol da preservação
do patrimônio acabam mostrando-se na teoria, problemáticas possíveis de
resolução; porém, na prática, elas nem sempre acabam mostrando resultados
significativos, pois muitas vezes, a comunidade local, não toma parte, nem participa,
indiferente às ações em favor do seu patrimônio histórico e cultural.
Nesse
contexto podemos analisar as questões acerca do próprio “sentimento de
patrimônio” junto à sociedade. Como despertar esse “sentimento” e torná-los
defensores e não meros espectadores de seu patrimônio. Sabemos que cada
sociedade, a seu tempo, preza valores, que se desenvolvem relacionados
diretamente ao seu patrimônio histórico, como uma memória herdada de seus
antepassados. Nesse paradoxo, o grande desafio está justamente nas inevitáveis
adaptações do bem patrimonial, sem comprometer valores que possam comprometer a
sua preservação. Por essa ótica, existe uma sintonia entre conservação e
mudança, que só é possível através de uma participação coletiva, constante em relação à defesa dos seus bens
patrimoniais, históricos e culturais.
O
processo em favor da preservação da memória do patrimônio necessita de uma
mentalidade voltada à educação patrimonial, que possa atingir os diversos
níveis da sociedade, sobretudo, nas escolas de todos os níveis
Um dos desafios do trabalho com a Educação
Patrimonial é dar a estas múltiplas identidades um sentido de cidade sem
padronização ou homogeneização, cultivando valores que levarão ao respeito pela
diversidade e ao prazer de preservar o que os nossos antepassados nos deixaram
como herança. (REVISTA POR DENTRO DA HISTÓRIA, 2009, p. 9)
Nós
escolhemos refletir sobre a Capela do Pilar justamente porque acreditamos que
ela deveria ser objeto da Educação Patrimonial, através da conscientização pelas
novas gerações nas escolas, onde a preservação deste patrimônio não se resume
apenas ao seu estado físico (estrutural), mas deve ele, estar relacionado à
perspectiva da identidade dos indivíduos, em um determinado lugar, onde eles
criam suas raízes.
Esse
processo de conscientização, muitas vezes não é priorizado, pois ele demanda
tempo, na medida em que, as políticas básicas,
de preservação do patrimônio físico vão sendo realizadas, lentamente aqui e
acolá sem um compromisso mais amplo, da sociedade como um todo. Sabemos o
quanto é importante a ocupação de um patrimônio histórico, como a garantia de
sua integridade física, já que pode ser promovida uma série de ações práticas,
para fazer da capela do Pilar, de maneira especial, um “Patrimônio Vivo”, ou
seja, um patrimônio atuante.
A necessidade de adaptar e intervir é
intrínseca à história da preservação dos objetos arquitetônicos. Durante
séculos, as intervenções em edifícios existentes tinham como principal objetivo
a sua adequação às necessidades e exigências contemporâneas, podendo variar
desde o reuso dos materiais, destruição e abandono total decorrentes da perda
de função como em templos pagãos, anfiteatros, dentre outros, até
reconstruções, alterações no projeto original e adaptação para novos usos, como
no caso das basílicas romanas, construções laicas reutilizadas para funções
religiosas (LEMOS, 2006, p. 13).
Desde
1747, passando por boa parte dos principais acontecimentos históricos de
Taubaté, do Vale do Paraíba, bem como de momentos da história nacional, a
capela do Pilar vem demonstrando sua projeção em meio às complexidades da
sociedade atual. Oriunda dessa dualidade entre “o sagrado e o profano”, entre a
fé e a sociedade, temos nela a imagem de uma história, que, em sua trajetória,
possibilitou diversas histórias.
Histórias
que foram escritas pela sociedade, através de seus feitos, onde a memória do
tempo não apagou seus sinais, embora esquecidas por muitas vezes; memórias
essas que diversos nomes da historiografia local e regional relataram, como
depoimentos que possibilitaram e possibilitam contribuições para um melhor entendimento
do nosso passado.
“Por sua proximidade com a Igreja Matriz de
São Francisco das Chagas (Catedral Diocesana desde 1950, quando foi consagrada)
a Capela do Pilar sempre teve uma existência secundária em relação à Matriz,
tendo sido desativada para fins litúrgicos, após seu tombamento histórico,
ocorrido em 1944, sendo uma das poucas igrejas no Vale do Paraíba a ser
reconhecida como patrimônio histórico nacional. A partir daí, a capela teve uso
incerto, abrigando eventuais exposições de Arte e Cultura, até tornar-se Museu
de Arte Sacra de Taubaté, inaugurado em 1985, lá permanecendo até 2009.
Com a transferência do museu a Capela do
Pilar, infelizmente está relegada à própria sorte. Desocupada, permanece
fechada e sem a necessária conservação, tendo a sua própria integridade física
comprometida, pois no estado em que se encontra, provavelmente não durará muito
tempo mais”.
(Depoimento
Prof. Antonio Carlos de Argôllo de Andrade – Historiador da Divisão de Museus
de Taubaté).
Este
depoimento evidencia a importância deste patrimônio histórico taubateano,
objeto de nossa pesquisa.
Analisar
o passado mediante a ciência histórica consiste em analisar os homens no tempo
e no espaço que estão inseridos, porém, muito além do conhecimento científico
temos a sociedade comum, que também tem seu lugar na escrita da história.
Escrita essa, que a Capela do Pilar ao longo de seus anos de existência
possibilitou a uma imagem que mais nos aproxima de períodos onde nossa
identidade fora enraizada no passado, em uma Taubaté colonial sem traços
visíveis, a não ser por suas “ruas estreitas”, e, essa singela capela barroca.
Competindo
a nós o papel de contribuir para que a memória não seja esquecida, pois esse
papel está apenas no começo, e a missão é de todos nós.
Considerações Finais
Pudemos observar em nossa pesquisa,
que a Capela de Nossa Senhora do Pilar de Taubaté, conseguiu adentrar em
considerável parte da História brasileira por caminhos diversos e singelos,
onde ela talvez, em sua idealização através de Timóteo Corrêa de Toledo, não
imaginasse que viria a ser a protagonista “sobrevivente” do desenvolvimento
histórico de um povo e de toda uma região.
Chegamos ao término dessa primeira
etapa da pesquisa regional, a qual, pretendemos futuramente, ampliar nossas
análises sobre esse patrimônio histórico importante, com a convicção que a
ligação entre religião e sociedade se deu em Taubaté, tanto na história como na
memória das pessoas dessa capela, que participou através construção desta
capela e da devoção à Nossa Senhora do Pilar.
Ao longo de seus anos de
existência, alguns personagens importantes fizeram parte e construíram sua
história, tais como cidadãos de posse, vindo de famílias proeminentes; escravos
que, através de seus braços e pernas, edificam taipas e telhas dessa capela;
nobres Barões da sociedade cafeicultora que guardaram suas paredes, bem como se
valeram delas para testemunhar o Convênio do Café de Taubaté; sociedades
religiosas que nela, desempenharam papéis frente à sociedade taubateana.
É certo que não podemos analisar de
modo ufanista os símbolos da construção histórica, porém, na atualidade,
devemos justificar devidamente, a importância de um determinado bem cultural,
principalmente aqueles que atribuímos valores inerentes à memória de um povo.
Com isso, nosso papel de cidadãos conscientes, indivíduos que fazem parte de um
processo evolutivo, e, inseridos em meio ao mundo globalizado, em que, a
História, muitas vezes acaba por se tornar a Ciência do passado, e não a
Ciência dos homens no tempo, à medida que a compreensão em favor dos nossos
bens culturais e históricos seja ampliada no particularismo, pelos formadores
de opinião pública bem como nas escolas, através de um processo de
conscientização do valor histórico desses bens.
A partir dessa pesquisa percebemos
o processo histórico não se faz sozinho. Pois, infelizmente, constatamos que
esse patrimônio encontra-se no quadro de esquecimento através do imaginário
coletivo que, parece desvalorizar o papel desta capela no cenário da história
regional e nacional. Devido ao não entendimento e da não articulação entre os
vários poderes constituídos.
A Capela de Nossa Senhora do Pilar
de Taubaté é mais um símbolo oportuno na historiografia, que tivemos a grata
surpresa de demonstrar e contribuir de alguma maneira, para sociedade que é a
detentora da existência histórica.
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